Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Jurisprudência TJDFT - Prestação de contas. Curatela. Interdição. Despesas. Ausência de comprovação. Contas rejeitadas

quinta-feira, 22 de setembro de 2022, 13h52

APELAÇÃO. DIREITO DE FAMÍLIA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CURATELA. INTERDIÇÃO. DESPESAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. CONTAS REJEITADAS. 1. O curador possui a obrigação legal de prestar contas da sua administração. 2. Quando constatada a existência de um saldo em favor do curatelado e o curador não comprova as despesas, mesmo depois de ser devidamente intimado para tanto, a rejeição das contas é medida que se impõe. 3. Apelação desprovida.(TJDF 00010065220198070019 - Segredo de Justiça 0001006-52.2019.8.07.0019, Relator: HECTOR VALVERDE SANTANNA, Data de Julgamento: 02/02/2022, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 16/02/2022 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

 

Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS

TERRITÓRIOS

Órgão 2ª Turma Cível

Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0001006-52.2019.8.07.0019

APELANTE (S)

APELADO (S)

Relator Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANNA

Acórdão Nº 1397226

EMENTA

APELAÇÃO. DIREITO DE FAMÍLIA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CURATELA. INTERDIÇÃO. DESPESAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. CONTAS REJEITADAS.1. O curador possui a obrigação legal de prestar contas da sua administração.2. Quando constatada a existência de um saldo em favor do curatelado e o curador não comprova asdespesas, mesmo depois de ser devidamente intimado para tanto, a rejeição das contas é medida que se impõe.3. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do (a) 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito

Federal e dos Territórios, HECTOR VALVERDE SANTANNA - Relator, Alvaro Ciarlini - 1º Vogal e SANDRA REVES - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador Alvaro Ciarlini, em

proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. DESPROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do

julgamento e notas taquigráficas.

Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANNA

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por K. A. D. J. contra a sentença (id 30888525) proferida pelo Juízo da Vara Cível, de Família e de Órfãos e Sucessões da Circunscrição Judiciária do Recanto das Emas.K. A. D. J. e G. B. D. J. ajuizaram ação de prestação de contas com relação à curatela de M. F. D. J. referente ao período de janeiro de 2017 a janeiro de 2019.

A interdição de M. F. D. J. ocorreu nos autos de n. 0002836-58.2016.8.07.0019. G. B. D. J. foi

nomeado curador provisório, no entanto, em razão de divergências apontadas nos documentos pessoais, revogou-se a sua nomeação e nomeou-se a atual curadora, K. A. D. J (id 30887257).

A Promotoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios se manifestou pela intimação de K. A. D. J. e G. B. D. J. para que apresentassem: 1) a prestação de contas do período em que cada um exerceu a curadoria; 2) documentos indispensáveis para a correta análise das respectivas prestações de contas (id 30887253). K. A. D. J. e G. B. D. J. sustentaram a desnecessidade do ajuizamento de duas ações de prestação de contas (id 30887256).

A Promotoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios apresentou o Parecer Técnico n. 1191-2019 (id 30888461), elaborado pela Secretaria de Perícias e Diligências do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios. A conclusão do referido parecer apontou um saldo positivo em favor da interditada no valor de R$ 17.192,57 (dezessete mil e cento e noventa e dois reais e cinquenta e sete centavos). Ressaltou-se que as despesas glosadas totalizaram R$ 14.296,23 (quatorze mil e duzentos e noventa e seis reais e vinte e três centavos); a maior parte dessas despesas, no entanto, ocorreu antes da data da curatela provisória e não foi comprovada por recibos legíveis.

O Juízo de Primeiro Grau determinou a exclusão de G. D. J. do polo ativo da ação e a intimação de K. A. D. J. para ciência e atendimento aos termos do parecer técnico (id 30888462).

K. A. D. J. informou que as despesas anteriores à definição da curatela provisória estão sem recibos ou com recibos ilegíveis, pois ela e o irmão ainda não haviam sido orientados a respeito da manutenção e guarda dos recibos para a futura prestação de contas. Disse que após a definição da curatela provisória, a curadora passou a armazenar os recibos de pagamento e a registrar detalhadamente todas as despesas da interditada (id 30888465).

A Promotoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios se manifestou pela intimação de K. A. D. J. para comprovar os gastos de R$ 17.192,57 (dezessete mil e cento e noventa e dois reais e cinquenta e sete centavos) apurados em favor da curatelada (id 30888470).

K. A. D. J. apresentou recibo de pagamento de cuidadora e certidão negativa de débitos referente ao

Imposto Predial Territorial Urbano – IPTU do imóvel de M. F. D. J. (id 30888479). apresentou o Parecer Técnico n. 790-2020 (id 30888488).

A Promotoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios se manifestou pela remessa dos novos documentos apresentados por K. A. D. J. à Secretaria de Perícias e Diligências do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (id 30888505).

A Secretaria de Perícias e Diligências do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios apresentou o Parecer Técnico n. 104-20201 (id 30888513). A conclusão do referido parecer apontou um saldo pendente de comprovação no valor de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos).

A Promotoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios se manifestou pela rejeição das contas apresentadas pela curadora e pelo ressarcimento à curatelada do valor de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos) (id 30888519).

O benefício da gratuidade de justiça foi deferido à K. A. D. J. (id 30888520).

O Juízo de Primeiro Grau rejeitou as contas apresentadas pela curadora provisória e a condenou a ressarcir a M. F. de J. o valor de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos), nos seguintes termos (id 28892611):

(...)

Ante o exposto, rejeito as contas apresentadas pela Curadora Provisória K. A. de J. P. B., declarando-as incorretas.

Condeno a curadora Provisória a ressarcir a curadora M. F. de J. o valor de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos).

Por conseguinte, extingo o processo com resolução no mérito ( CPC, art. 487I).

Deixo de fixar honorários advocatícios, diante da ausência de litigiosidade em procedimento de jurisdição voluntária (STJ, REsp 1.431.036/SP). Condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais.

Transitada em julgado, traslade-se cópia desta sentença e respectiva certidão de trânsito em julgado para os autos da ação de interdição (PJe 0002836-58.2016.8.07.0019).

Sem mais requerimentos, arquivem-se os autos com as cautelas de estilo. K. A. D. J. apelou (id 30888529). Sustenta que os cuidados com a curatelada demandam os mais diversos tipos de deslocamento, os quais são realizados pelo núcleo familiar e geram elevados gastos. Alega que não houve má-fé nem falta de zelo pela curadora, que sempre primou pelo bem-estar de sua genitora durante o exercício da curatela. Ressalta que, abatidos os valores referentes ao abastecimento de veículos, por exemplo, durante todo o tempo em que ficou vigente a curatela provisória, qualquer diferença entre os rendimentos e os gastos é irrisória. Afirma que deve haver a flexibilização do rigor da lei, tendo em vista que a curadora demonstrou que agiu com honestidade e boa-fé e apenas não conseguiu comprovar aquilo que estava além de sua responsabilidade. Preparo dispensado, em face da concessão do benefício da gratuidade de justiça à apelante (id

30888520).

A Procuradoria de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (id 31206566).

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANNA - Relator

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação.

Trata-se de apelação interposta por K. A. D. J. contra a sentença (id 30888525) proferida pelo Juízo da Vara Cível, de Família e de Órfãos e Sucessões da Circunscrição Judiciária do Recanto das Emas nos autos da ação de prestação de contas ajuizada pela apelante e G. D. J. que rejeitou as contas apresentadas pela curadora provisória e a condenou a ressarcir a M. F. D. J. o valor de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos).

A curatela é o encargo deferido por lei a alguém capaz com a finalidade de reger a pessoa e administrar os bens de quem, em regra maior, não pode fazê-lo por si mesmo.[1]

A curatela tem por objeto atos negociais e patrimoniais. O curador possui, assim, o dever ético e jurídico de prestar contas a fim de comprovar a sua probidade e lisura e assegurar a proteção do incapaz.[2]

Nesse sentido, o art. 1.774 do Código Civil estabelece que se aplicam à curatela as disposições concernentes à tutela, com as modificações dos artigos seguintes e o art. 1.781 dispõe que as regras a respeito do exercício da tutela aplicam-se ao da curatela, com a restrição do art. 1.772 e as desta Seção.

O art. 1.755 do Código Civil, por sua vez, estipula que os tutores, embora o contrário tivessem disposto os pais dos tutelados, são obrigados a prestar contas da sua administração.

 

Observa-se, assim, que os curadores possuem a obrigação legal de prestar contas da sua administração.

No caso em análise, K. A. D. J. foi nomeada curadora provisória de M. F. D. J. na ação de interdição n. 0002836-58.2016.8.07.0019. A prestação de contas se refere ao período de janeiro de 2017 a janeiro de 2019.

K. A. D. J. apresentou documentos com o objetivo demonstrar a regularidade das contas (id 30887247 e 30887248). Referida documentação foi analisada pela Secretaria de Perícias e Diligências do

Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios, a qual verificou a existência de valores pendentes de comprovação (id 30888461). apresentação de documentos novos que comprovassem a pendência apurada, conforme parecer da Secretaria de Perícias e Diligências do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (id 30888513):

(...)

3. Inicialmente, cumpre registrar que no Parecer Técnico n. 790/2020 apuramos a pendência de comprovação de R$ 7.050,04 (R$ 282,00 por mês) referente à prestação de contas de janeiro de 2017 a janeiro de 2019.

4. Após o parecer anterior, a curadora informou que não houve a inclusão na prestação de contas de alguns gastos com o transporte da interditada, como Uber e gasolina, para a realização dos tratamentos médicos. Para comprovar essas despesas, solicitou a dilatação do prazo, o que foi concedido, consoante se verifica na Decisão de ID n. 73398050.

5. Em seguida, conforme a Petição de ID n. 77207472, a curadora apresentou os seguintes documentos:

 

(...)

6. Cumpre registrar que não houve apresentação de documentos novos que comprovem despesas e alterem o valor da pendência apurada no parecer anterior. As cópias de utilização de Uber são de 2019, período diverso da presente análise, e os documentos do GDF não se referem a gastos e sim retiradas de medicamentos nas unidades de saúde desde 2016.

7. Nos autos, a curadora explicou que os gastos de transporte são difíceis de comprovar pois as vezes ela coloca gasolina no carro de um parente ou vizinho e assim podem dar prosseguimento ao tratamento da interditada. Outras vezes utilizam o transporte do Uber.

(...)

9. Senhor (a) Promotor (a), como resultado dos nossos trabalhos e diante das considerações feitas, informamos que não houve a juntada de documentos novos que alterem o saldo pendente de comprovação de R$ 7.050,04 (R$ 282,00 por mês). Os documentos de Uber apresentados são de 2019 e os do GDF se referem ao tratamento da interditada que ocorre desde 2016.

10. A curadora explicou que os gastos com transporte para dar prosseguimento ao tratamento da interditada são de difícil comprovação pois as vezes colocam gasolina no carro de um conhecido ou parente e vão até a unidade de saúde.

Na prestação de contas, é imprescindível especificar as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver. É necessário, além disso, juntar documentos idôneos comprobatórios das receitas e das despesas, nos termos do art. 551 do Código de Processo Civil.[3]

No caso dos autos, K. A. D. J. não comprovou parte das despesas efetuadas.

Nesse contexto, ante a ausência de comprovação de despesas no montante de R$ 7.050,04 (sete mil e cinquenta reais e quatro centavos), correta a sentença que rejeitou as contas e condenou K. A. D. J. a ressarcir a M. F. D. J. os valores relativos aos gastos não comprovados.

Mantenho a sentença.

Deixo de majorar os honorários advocatícios, nos termos do art. 85§ 11, do Código de Processo Civil, tendo em vista a ausência de fixação da verba na sentença.

É como voto.

[1] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. 6 vol. E-book. Sem página cadastrada.

[2] CHAVES DE FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil – Famílias. 13. ed. Salvador: JusPodivm, 2021. p. 1.014.

[3] Art. 551. As contas do réu serão apresentadas na forma adequada, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver.

§ 1º Havendo impugnação específica e fundamentada pelo autor, o juiz estabelecerá prazo razoável para que o réu apresente os documentos justificativos dos lançamentos individualmente impugnados.

§ 2º As contas do autor, para os fins do art. 550, § 5º , serão apresentadas na forma adequada, já instruídas com os documentos justificativos, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver, bem como o respectivo saldo.

O Senhor Desembargador Alvaro Ciarlini - 1º Vogal

Com o relator

A Senhora Desembargadora SANDRA REVES - 2º Vogal

Com o relator

DECISÃO

CONHECIDO. DESPROVIDO. UNÂNIME.


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