TJSP: Sabesp não deve fornecer água para casa em área de preservação permanente
quarta-feira, 10 de dezembro de 2025, 15h22

A 29ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou um pedido de uma moradora de Guarujá (SP) para ligação de sistema de água e esgoto em sua casa. Ela vive em um loteamento irregular localizado em área de preservação permanente.
“Deve se sobressair o direito da coletividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito que assiste não apenas à coletividade atual, como, ainda, às futuras gerações”, destacou o desembargador Mário Daccache, relator do recurso. O julgador embasou o seu entendimento no caput do artigo 225 da Constituição Federal, que trata sobre o tema.
A autora ajuizou em 2019 ação de obrigação de fazer contra a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e o município de Guarujá. Ela narrou que reside há 26 anos no imóvel citado na inicial, mas nunca teve acesso às redes de água e esgoto, apesar de lhe ser fornecida energia elétrica e ter acesso a serviço de internet.
De acordo com a autora, a Sabesp sempre indeferiu os seus pedidos de fornecimento de água, sob o argumento de que a moradia se localiza em área irregular. Conforme a empresa, o atendimento do requerimento dependeria de expressa autorização do município, o que nunca houve. A Sabesp e o Executivo municipal confirmaram a recusa em juízo, defendendo a improcedência da ação.
O juiz Cândido Alexandre Munhóz Pérez, da Vara da Fazenda Pública de Guarujá, julgou a ação improcedente em maio. O magistrado mencionou, na sentença, laudo pericial “minucioso, amplamente fundamentado, de onde se extrai que o imóvel está inserido em área cuja regularização fundiária é potencialmente inviável, diante de sua proximidade com o Rio Osteiras, área de preservação permanente”.
Apesar da conclusão da perícia, a autora recorreu. Ela acrescentou na apelação que, na mesma quadra de sua casa, situada na Vila Santa Rosa III, funciona uma escola municipal com os serviços básicos garantidos. Além disso, vários vizinhos dispõem de fornecimento de água.
Tratamento diferente
Daccache, relator no TJ-SP, disse que o fato de o imóvel estar localizado em loteamento irregular, por si só, não é suficiente para impedir o usufruto de serviços essenciais — energia elétrica, água e esgoto. No entanto, ele ponderou que o caso dos autos possui uma particularidade e exige posicionamento diferente.
“O imóvel da autora, conforme constatado em perícia realizada nos autos, está localizado em área ambiental de preservação permanente, considerado inclusive como ‘crítico’, dada à sua proximidade com o Rio Osteiras”, frisou o julgador. Por essa razão, ele defendeu que não é possível acatar os pedidos da autora.
“Há uma diferença entre a negativa da concessionária de serviço essencial baseada na simples irregularidade documental do loteamento e na negativa baseada no fato de o imóvel estar em área ambiental especialmente protegida”, concluiu Deccache. Os desembargadores Barbosa Ferreira e Silvia Rocha seguiram o seu voto.
Ações civis públicas
A decisão do colegiado também levou em conta duas ações civis públicas envolvendo o loteamento em que a autora mora. Ambas ainda estão em curso. Na primeira delas, ajuizada em 2002, o Ministério Público de São Paulo pleiteia a “desocupação das áreas ou faixas em que são terminantemente proibidos o desmatamento, remoção de cobertura vegetal, obras ou edificações”.
Segundo o MP-SP, órgãos de proteção do meio ambiente não foram consultados sobre a possibilidade, ou não, de aprovação da regularização do loteamento, apesar de estar localizado em área coberta por manguezal, na Mata Atlântica, classificada como reserva ecológica.
Na outra ação civil pública, de 2021, o autor é o próprio município de Guarujá, que pede a interrupção das degradações ambientais na área loteada. Para a 29ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, a tramitação dessas ações civis reforça o acerto da sentença que julgou improcedente a demanda da moradora que pretendia a ligação de água e esgoto em sua casa.
“A situação envolvendo o loteamento em que se situa o imóvel da autora é complexa e as irregularidades no referido loteamento estão sendo discutidas nas demandas coletivas acima mencionadas. (…) Não se mostram corretas, portanto, soluções individuais e pontuais, como a pretendida nesta demanda. Por esses fundamentos, a ação é realmente improcedente”, diz o acórdão.
Processo 1012925-60.2019.8.26.0223
Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: CONJUR