Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Jurisprudência TST - Aposentadoria de um salário mínimo. Impossibilidade de penhora. Necessidades básicas. Pessoa idosa

terça-feira, 13 de outubro de 2020, 15h37

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DITO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.105 / 15. EXECUÇÃO. PENHORA DE 50% DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA RECEBÍVEIS. ATO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. PARTICULARIDADE DO CASO CONCRETO. PERCEBIMENTO DE SALÁRIO MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE DE PENHORA. ARTS. 1º, III, E 7º, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO.

I. O art. 7º, Inciso IV, da CRFB dentre os direitos e garantias fundamentais um salário mínimo, " capaz de atender às suas necessidades vitais básicas e às suas famílias com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo ", erigindo-o como instrumento de preservação da dignidade da pessoa humana .II. No caso concreto, durante a fase de execução da ação subjacente, ao verificar que o subsidiário recebia proventos de aposentadoria, o magistrado da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo determinou a penhora de 50% de seus ganhos líquidos, com base nos arts. 833, § 2º, e 529 do Código de Processo Civil de 2015.III. A fim de cassar os efeitos dessa decisão, o desencadear impetrou mandado de segurança, alegando a impenhorabilidade dos proventos de aposentadoria.IV. O Tribunal Regional a quo , ao observar que a perdida percebia o valor de apenas um salário mínimo de proventos, concedeu-lhe a segurança. V. Diante disso, o exequente, litisconsorte passivo, interpôs recurso ordinário, sustentando ser " plenamente possível a penhora parcial de salário ou benefício previdenciário para satisfação de verba de caráter alimentar ". Requereu a manutenção da decisão atacada. VI. Contudo, não obstante a alteração na jurisprudência dessa Corte Superior, que passou a considerar possível a determinação de penhora de vencimentos realizados na vigência do CPC de 2015 para satisfação de débitos de natureza trabalhista, desde que limitada a 50% do montante recebível, observado- se que o caso dos autos possui verdadeiras particularidades.VII. Da leitura dos documentos colacionados com o inicial, ficou comprovado que a formação, hoje com 75 anos de idade, percebe proventos de aposentadoria no valor de um salário mínimo.VIII. Destarte, realizando-se uma ponderação entre o direito do exequente de ver seu crédito satisfeito e a própria subsistência da propagação, o qual seria condenado a sobreviver com metade de um salário mínimo até a satisfação total do débito, concluiu-se que este se sobressai em detrimento daquele, com base na dignidade da pessoa humana, fundamento da república (art. 1º, III, da Constituição da República).IX. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.(TST - RO-1002653-49.2018.5.02.0000, Relator: Evandro Pereira Valadão Lopes,Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Julgamento: 29/09/2020,Publicação: 02/10/2020).

Inteiro teor do acórdão, segue abaixo colacionado:

A C Ó R D Ã O

(SDI-2)

GMEV/jon/ROS/csn/iz

 

 

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DITO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.105/15. EXECUÇÃO. PENHORA DE 50% DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA RECEBÍVEIS. ATO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. PARTICULARIDADE DO CASO CONCRETO. PERCEBIMENTO DE SALÁRIO MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE DE PENHORA. ARTS. 1º, III, E 7º, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO.

I. O art. 7º, Inciso IV, da CRFB prevê dentre os direitos e garantias fundamentais um salário mínimo, " capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo ", erigindo-o como instrumento de preservação da dignidade da pessoa humana .

II. No caso concreto, durante a fase de execução da ação subjacente, ao verificar que o executado subsidiário recebia proventos de aposentadoria, o magistrado da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo determinou a penhora de 50% de seus ganhos líquidos, com base nos arts. 833, § 2º, e 529 do Código de Processo Civil de 2015.

III. A fim de cassar os efeitos dessa decisão, o executado impetrou mandado de segurança, alegando a impenhorabilidade dos proventos de aposentadoria.

IV. O Tribunal Regional a quo , ao observar que o executado percebia o valor de apenas um salário mínimo de proventos, concedeu-lhe a segurança. V. Diante disso, o exequente, litisconsorte passivo, interpôs recurso ordinário, sustentando ser " plenamente possível a penhora parcial de salário ou benefício previdenciário para satisfação de verba de caráter alimentar ". Requereu a manutenção da decisão atacada.

VI. Contudo, não obstante a alteração na jurisprudência dessa Corte Superior, que passou a considerar possível a determinação de penhora de vencimentos realizados na vigência do CPC de 2015 para satisfação de débitos de natureza trabalhista, desde que limitada a 50% do montante recebível, observou-se que o caso dos autos possui verdadeiras particularidades.

VII. Da leitura dos documentos colacionados com a inicial, ficou comprovado que o executado, hoje com 75 anos de idade, percebe proventos de aposentadoria no valor de um salário mínimo.

VIII. Destarte, realizando-se uma ponderação entre o direito do exequente de ver seu crédito satisfeito e a própria subsistência do executado, o qual seria condenado a sobreviver com metade de um salário mínimo até a satisfação total do débito, concluiu-se que este se sobressai em detrimento daquele, com base na dignidade da pessoa humana, fundamento da república (art. 1º, III, da Constituição da República).

IX. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.

 

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n° TST-RO-1002653-49.2018.5.02.0000 , em que é Recorrente (...) , Recorrido (...) e Autoridade Coatora JUIZ TITULAR DA 33ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO .

 

Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança interposto pelo Litisconsorte passivo, exequente nos autos subjacentes, em face do acórdão proferido pela SDI-6 do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em que se concedeu a segurança ao impetrante para cassar os efeitos da decisão do magistrado na ação originária, que havia determinado a penhora de 50% dos ganhos líquidos (proventos) do executado.

Foram apresentadas contrarrazões às fls. 129-132.

O Ministério Público do Trabalho oficiou pelo conhecimento e não provimento do apelo (fls. 140-141).

É o relatório.

 

V O T O

 

1. CONHECIMENTO

 

Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade recursal quanto à tempestividade (fl. 125) e à representação processual (fl. 86), e não havendo condenação em custas, conheço do recurso ordinário.

 

2. MÉRITO

 

DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PENHORA DE PERCENTUAL DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ATO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DO CPC DE 2015.

 

No trâmite da ação matriz, já em fase de execução, restaram infrutíferas as diligências para localizar bens passíveis de penhora da empresa reclamada.

Assim, determinou-se a inclusão do Sr. Diogo Miguel Parra no polo passivo da demanda, passando a responder pelo débito exequendo.

Ao verificar que o novo executado recebia proventos da Previdência Social, o magistrado da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo proferiu a seguinte decisão, apontada como ato coator:

 

Ante a resposta do convênio Infojud, autuado em apartado ante o caráter sigiloso das informações, verifica-se que o executado Diogo Miguel Parra recebe proventos oriundos da Previdência Social.

O § 2º do artigo 833 do CPC, aplicável ao Processo do Trabalho nos termos da Instrução Normativa nº 39 do TST, autoriza a penhora de salário em duas situações:

1. Quando a origem da dívida não for alimentar. Neste caso, o salário somente pode ser penhorado quando o valor líquido ultrapassar os cinquenta salários mínimos;

2. Quando se tratar de dívida alimentar, sendo que, neste caso, não importa o valor do salário, devendo ser observado o disposto no artigo 529, § 3º do CPC.

Possuindo, o crédito do exequente, natureza alimentar, determino a penhora de 50% dos seus ganhos líquidos, nos exatos termos do § 2o do art. 833 e § 3o do art. 529, ambos do CPC, ante o requerimento formulado pelo autor às fls. 452/454.

Intime-se o autor e expeça-se o mandado de penhora. (fl. 20; grifos apostos)

 

Em face desta decisão, o executado impetrou mandado de segurança alegando que os proventos de aposentadoria seriam impenhoráveis (art. 833, IV, do CPC de 2015). Sustentou que não seria hipótese de dívida de caráter alimentício. Aduziu que " a parca aposentadoria que aufere o Impetrante, serve para se manter minimamente, em especial se considerar a avançada idade deste (73 anos de vida) " (fl. 5; datado de 30/09/2018).

O Tribunal Regional concedeu a segurança, cassando os efeitos do ato apontado como coator sob os seguintes fundamentos, verbis :

 

V O T O

O mandado de segurança tem previsão na Constituição Federal (art. 5º) e encontra-se regulamentado pela Lei nº 12.016/2009, a qual dispõe ser cabível o Mandado de Segurança para correção de ilegalidade praticada por meio de decisão judicial e para proteção de direito líquido e certo sempre que não for cabível recurso com efeito suspensivo (art. 1º combinado com o art. 5º da Lei nº 12.016/2009).

O direito deve ser líquido e certo, que, em linhas gerais, significa que é aquele que pode ser demonstrado de plano por meio de prova pré-constituída e que, por isso, é manifesto quanto à sua existência e à sua extensão.

A aposentadoria é, via de regra, protegida pela regra da impenhorabilidade, conforme dispõe a Súmula nº 21 deste Regional:

Mandado de Segurança. Penhora on line.

Considerando o disposto no art. 649, incisos IV e X do CPC, ofende direito líquido e certo a penhora sobre salários, proventos de aposentadoria, pensão e depósitos em caderneta de poupança até 40 salários mínimos. (Res. nº 02/2014- DOEletrônico 17/09/2014 - Republicada DOEletrônico 02/10/2014)

Afasto, portanto, a preliminar de impropriedade da medida, arguida pelo litisconsorte.

No caso, a documentação encartada com a reiteração do pedido de tutela de urgência (7dae45c), revela que o impetrante recebe um salário mínimo de aposentadoria e, conforme constou na r. decisão de deferimento da liminar, nos termos do art. 7º, inciso IV, da Constituição Federal, o salário mínimo visa atender as necessidades vitais básicas do trabalhador (no caso, aposentado) e de sua família e, portanto, constitui-se em patamar mínimo para sua subsistência, de modo que a determinação de penhora de 50% deste valor fere tal garantia constitucional e destoa do objetivo do processo de execução, qual seja, obter a satisfação de um crédito sem retirar o indispensável à sobrevivência do devedor.

Tal posicionamento encontra-se inclusive consubstanciado na Orientação Jurisprudencial nº 153 da SBDI-II do C.TST, a qual dispõe:

153. Mandado de segurança. Execução. Ordem de penhora sobre valores existentes em conta salário. Art. 649, IV, do CPC de 1973. Ilegalidade. (atualizada em decorrência do CPC de 2015) (DeJT 03/12/2008. Redação alterada pela Res. n° 220/2017, DeJT 21/09/2017) Ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649, IV, do CPC de 1973 contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art 649, § 2º, do CPC de 1973 espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista.

Acrescente-se que este também tem sido o entendimento do C. Tribunal Superior do Trabalho, conforme aresto abaixo transcrito:

"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA DA LITISCONSORTE EXECUÇÃO DEFINITIVA - PENHORA DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA DO SÓCIO DA EMPRESA EXECUTADA - ILEGALIDADE DO ATO COATOR. A decisão recorrida, que concedeu a segurança pretendida pelo executado para determinar a imediata revogação da penhora correspondente a 30% dos seus proventos de aposentadoria recebidos da Marinha do Brasil, encerra posicionamento jurisprudencial em consonância com a Orientação Jurisprudencial nº 153 da Subseção II da Seção Especializada em Dissídios Individuais, que reconhece a ofensa a direito líquido e certo quando há o bloqueio de numerário existente em conta salário para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos, porquanto os proventos de aposentadoria são absolutamente impenhoráveis, nos termos do art 649 , IV , do CPC . Recurso ordinário conhecido e desprovido." (Processo: RO4685220135120000, Relator(a): Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Julgamento: 07/04/2015, Órgão Julgador: Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Publicação: DEJT 08/05/2015)

Diante do exposto, concedo a segurança pleiteada.

ACORDAM os Magistrados da SDI nº 6 do Tribunal Regional do

Trabalho da 2ª Região em: por unanimidade de votos, conceder, em definitivo, a segurança requerida, para que não seja determinada a penhora dos proventos de aposentadoria do impetrante, ratificando liminar concedida, nos termos da fundamentação do voto do relator. Custas nihil. Dê-se ciência à D. autoridade coatora. (fls. 95-98 – aba "Visualizar todos os PDFs")

 

Diante disso, o Litisconsorte passivo interpôs o presente recurso ordinário, alegando que " o exequente aguarda a satisfação de seu crédito desde 2006, cuja natureza é alimentar " e que " a sonegação sem dúvida comprometeu a sua sobrevivência e de sua família " (fl. 118).

Aduz que " é plenamente possível a penhora parcial de salário ou benefício previdenciário para satisfação de verba de caráter alimentar ", nos termos do art. 833, § 2º, do CPC. Sustenta que a autoridade dita coatora observou o limite legal de 50% na penhora dos vencimentos do executado.

Obtempera que " a execução deve ser direcionada no interesse do autor da demanda principal, parte hipossuficiente da relação capital x trabalho " (fl. 121).

Ao exame.

Inicialmente, registre-se que o ato dito coator, o qual determinou a penhora de 50% nos proventos de aposentadoria do executado, ocorreu em 13/09/2018, ou seja, já na vigência do Código de Processo Civil de 2015.

Essa Corte Superior possuía jurisprudência consolidada no sentido de que o art. 649, IV, do CPC de 1973 continha norma imperativa que não admitia interpretação ampliativa, "sendo a exceção prevista no art. 649, § 2º, do CPC espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista". Assim, ofenderia direito líquido e certo do executado a decisão que determinava a penhora sobre os valores existentes em conta salário.

Esse, aliás, era o teor da Orientação Jurisprudencial nº 153 desta Subseção Especializada.

Com o advento da nova lei civil adjetiva, cuja vigência se deu em 18/03/2016, este Tribunal Superior editou a referida Orientação Jurisprudencial a fim de limitar aquele entendimento aos atos proferidos na vigência da lei revogada, verbis :

 

153. MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO. ORDEM DE PENHORA SOBRE VALORES EXISTENTES EM CONTA SALÁRIO. ART. 649, IV, DO CPC DE 1973. ILEGALIDADE.   (atualizada em decorrência do CPC de 2015) - Res. 220/2017, DEJT divulgado em 21, 22 e 25.09.2017 Ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649, IV, do CPC de 1973 contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art. 649, § 2º, do CPC de 1973 espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista.

 

Assim, com a substancial alteração legislativa, esse Tribunal Superior passou a considerar possível a determinação de penhora de vencimentos realizados na vigência do CPC de 2015 para satisfação de débitos de natureza trabalhista, desde que limitada a 50% do montante recebível.

A título de exemplo, colaciono o seguinte julgado dessa Subseção, ipsis litteris :

 

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CPC/2015. ATO COATOR CONSUBSTANCIADO EM PENHORA DE CONTA CORRENTE. LEGALIDADE. INAPLICABILIDADE DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 153 DA SBDI-2. ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA. PREVISÃO LEGAL. ARTIGOS 529, § 3º, E 833, § 2º, DO CPC. O ato coator combatido no mandamus é a determinação de bloqueio de valores existentes em conta corrente do impetrante. É de se reconhecer que a ordem de bloqueio foi expedida na vigência do Código de Processo Civil de 2015. Conforme a nova disciplina processual estabelecida, a impenhorabilidade dos vencimentos não se aplica nos casos em que a constrição seja para fins de pagamento de prestação alimentícia "independente de sua origem", como é o caso das verbas de natureza salarial devidas ao empregado. Note-se que a expressão destacada não existia no CPC de 1973 e, por essa razão, esta Corte Superior consagrou o entendimento segundo o qual a exceção do revogado art. 649, § 2°, do CPC/1973 fazia referência apenas à prestação alimentícia fixada com espeque no art. 1.694 do CC/2002. No que tange ao valor do bloqueio efetuado, a jurisprudência desta Subseção Especializada é no sentido de que é lícita a penhora de até o limite de 50% estabelecido no § 3º do artigo 529, também do CPC/2015. No caso em tela, porém, a partir das provas pré-constituídas , identifica-se que o valor bloqueado em conta corrente não ultrapassou o limite legal, bem como que os valores depositados não tinham a sua totalidade com a rubrica de salário . Nesse aspecto, não se constata nenhuma ilegalidade ou abusividade no ato apontado como coator pelo executado , sendo inaplicável ao caso a modulação de efeitos estabelecida na OJ nº 153 desta eg. SBDI-2. Não se há de falar, portanto, em afronta a direito líquido e certo. Precedentes específicos desta eg. SBDI-2. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (RO-241-81.2018.5.05.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 19/12/2019) .

 

Contudo, o caso concreto apresenta verdadeira particularidade em relação às demais lides em que se aplicou o entendimento retromencionado .

Consta do acórdão recorrido que a documentação apresentada com a inicial do mandado de segurança revelaria " que o impetrante recebe um salário mínimo de aposentadoria " (fl. 96).

A Constituição da República dispõe expressamente acerca do salário mínimo percebível:

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

 

Calcado nesse dispositivo, é possível se observar que esse montante é considerado o mínimo , dadas as circunstâncias, que uma pessoa possa receber para atender suas " necessidades vitais básicas ", o que, pela realidade do país, sabe-se que ainda está deveras aquém do ideal.

Não bastasse isso, a situação se agrava diante dos fatos de que os rendimentos se tratam de provento de aposentadoria, e de que o executado, impetrante, possui 75 anos, estando presumivelmente impossibilitado de retornar ao mercado de trabalho para complementar tal renda.

Destarte, realizando-se uma ponderação entre o direito do exequente de ver seu crédito satisfeito e a própria subsistência do executado, o qual seria condenado a sobreviver com metade de um salário mínimo até a satisfação total do débito, conclui-se que este se sobressai, diante do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição da República).

Assim, não merece qualquer reparo o acórdão recorrido que, concedendo a segurança pleiteada, cassou os efeitos da decisão que determinava a penhora de 50% dos ganhos líquidos do executado, impetrante e ora recorrido.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.

 

ISTO POSTO

 

ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do recurso ordinário e, no mérito, negar-lhe provimento .

Brasília, 29 de setembro de 2020.

 

 

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

EVANDRO VALADÃO

Ministro Relator

 


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