Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Jurisprudência TJGO - Pessoa idosa com alzheimer. Curatela compartilhada. Melhor interesse da curatelada. Possibilidade

quarta-feira, 05 de outubro de 2022, 15h47

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. IDOSA PORTADORA DE ALZHEIMER. CURATELA COMPARTILHADA. MELHOR INTERESSE DA CURATELADA. CC ART. 1.775-A. POSSIBILIDADE. Evidenciado que a curatela compartilhada entre as filhas de idosa portadora de Alzheimer é consentânea ao seu melhor interesse, notadamente diante do desgaste emocional e físico nos tratos de pessoa portadora desse mal, impõe-se a sua decretação, nos termos do artigo 1.775-A do Código Civil, alterado pela Lei nº 13.146, de seis de julho de 2015. Apelação conhecida e provida. Sentença parcialmente reformada.(TJGO - 02493958620178090120 PARAÚNA, Relator: Des(a). ITAMAR DE LIMA, Data de Julgamento: 23/03/2021, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 23/03/2021).

Gabinete do Desembargador Itamar de Lima

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0249395-86.2017.8.09.0120

Comarca de Paraúna

3ª CÂMARA CÍVEL

APELANTE: 

APELADAS: 

RELATOR: Desembargador ITAMAR DE LIMA

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. IDOSA PORTADORA DE ALZHEIMER. CURATELA COMPARTILHADA. MELHOR INTERESSE DA CURATELADA. CC ART. 1.775-A. POSSIBILIDADE.

Evidenciado que a curatela compartilhada entre as filhas de idosa portadora de Alzheimer é consentânea ao seu melhor interesse, notadamente diante do desgaste emocional e físico nos tratos de pessoa portadora desse mal, impõe-se a sua decretação, nos termos do artigo 1.775-A do Código Civil, alterado pela Lei nº 13.146, de seis de julho de 2015.

Apelação conhecida e provida. Sentença parcialmente reformada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os integrantes da 4ª Turma Julgadora em sessão da 3ª Câmara Cível , à unanimidade , em conhecer apelação e provê-la, nos termos do voto do relator. Sentença parcialmente reformada.

Votaram com o relator , os desembargadores Anderson Máximo de Holanda, Gilberto Marques Filho e o Dr. Wilson Safatle Faiad - Juiz respondente cargo vago desembargador.

Presidiu a sessão, desembargador Itamar de Lima.

Presente a Procuradora de Justiça Dra. Orlandina Brito Pereira.

Goiânia, 22 de março de 2021.

Desembargador ITAMAR DE LIMA

Relator

V O T O D O R E L A T O R

Presentes os requisitos legais de admissibilidade do recurso, dele conheço.

Como visto no relatório, cuida-se de apelação cível interposta contra a sentença em cujo bojo julgou procedente o pedido de interdição formulado na inicial, da seguinte forma:

“JULGO PROCEDENTE o pedido e DECRETO a INTERDIÇÃO de (...), qualificada nos autos, declarando-a incapaz de praticar quaisquer atos da vida civil, sem que esteja assistido por sua curadora.

Nomeio para assumir o encargo de curadora a Sra. (...), que já se encontra cuidando da interditanda, esta deverá assinar o respectivo Termo de Compromisso, no prazo máximo de 05 (cinco) dias, contados a partir do trânsito em julgado (CPC, art. 759). Saliente-se no termo que é terminantemente vedada a alienação ou oneração de quaisquer bens móveis, imóveis, ou de qualquer natureza, pertencentes a interditada, salvo com autorização judicial. Assim como, é proibido contrair qualquer espécie de empréstimo em nome da incapaz.

Expeça-se mandado para inscrição no Registro de Pessoas Naturais onde se acha lavrada a certidão de nascimento e/ou casamento da interditada (CPC, art. 755§ 3º).

Oficie-se, outrossim, ao mesmo Cartório, para registro da sentença em livro próprio (Lei 6015/73, art. 92, caput). Após o registro da sentença, expeça-se o Termo de Compromisso da curadora.

A fim de assegurar à idosa interditada o direito à convivência familiar, poderá a requerente ter a mãe em sua companhia aos finais de semana, a cada 15 (quinze) dias, podendo pegála a partir das 08:00 horas da sexta-feira e devendo devolvê-la até as 18:00 horas de domingo. Sem custas.”

A insurgência recursal funda-se na alegação de que a sentença merece reforma parcial, a fim de determinar a curatela compartilhada da idosa, a ser exercida pela Sra.(...) e pela apelante (...), ambas filhas da curatelada, por ser acepção do seu melhor interesse.

Com razão.

A curatela, assim como a tutela, é um munus público a ser exercido na proteção dos interesses de pessoa que, não obstante a plena habilitação à prática dos atos da vida civil adquirida com o advento da maioridade, não detém discernimento para tanto em razão de enfermidade, deficiência mental ou que por outra causa duradoura não possa exprimir a sua vontade, ou, ainda, por prodigalidade. Logo, o instituto tem por finalidade a proteção do curatelado e de seus bens.

Código Civil, em seu art. 1.781, estabelece a aplicação das regras do exercício da curatela, de modo que incumbe aos curadores, por exemplo, o dever de defesa, sustento e representação do interdito, bem como de administração de seus bens.

Não obstante a lei civil estabelecer um rol preferencial de pessoas a serem designadas curadoras, na ordem constante do art. 1.775 do CCB, há que se ter em mente que “tanto na tutela quanto na curatela é o interesse do incapaz que deve prevalecer”, conforme assinala SILVIO RODRIGUES, in Direito civil, 27. ed., v. 6º, Direito de Família, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 455.

Com o advento da Lei nº 13.146 de 06 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que fez alterações no Código Civil, a curatela compartilhada passou a ser expressamente permitida no artigo 1.775-A, do Código Civil:

“Art. 1.775-A. Na nomeação de curador para a pessoa com deficiência, o juiz poderá estabelecer curatela compartilhada a mais de uma pessoa”.

Sobre a questão, eis a proficiente lição de Flávio Tartuce:

“Trata-se de uma previsão normativa muito interessante que, em verdade, tornará oficial uma prática comum. Por vezes, no seio de uma família, mais de um parente, além do próprio curador, conduz a vida da pessoa com deficiência, dispensando-lhe os necessários cuidados. Pois bem. O novo instituto permitirá, no interesse do próprio curatelado, a nomeação de mais de um curador, e, caso haja divergência entre eles, caberá ao juiz decidir, como ocorre na guarda compartilhada.” (TARTUCE, Flávio. É o fim da interdição. Jusbrasil. 2.016. Disponível em https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/304255875/eofim-dainterdicao-artigo-de-pablo-stolze gagliano#:~:text=Finalmente%2C%20merece%20especial%20refer%C3%Aa ncia%20a,a%20mais%20de%20uma%20pessoa.%E2%80%9D, acesso em 13.03.2021).

Diante disso, em situações como a dos autos, como bem assentado pela Procuradoria-Geral da Justiça em seu judicioso parecer, “o desgaste emocional e físico nos tratos de pessoa portadora de mal de Alzheimer, por si só, aconselha a repartição de tarefas entre uma segunda curadora que, poderá auxiliar na gestão dos bens e interesses da interditanda sem sobrecarregar apenas uma das partes”.

E complementa, “ademais, inexiste oposição dos demais filhos, dentre eles o Sr. (...), quanto à interdição e constituição da apelante como uma das curadoras, conforme petição jungida ao feito (fls. 138/139)”.

Deste modo, forçoso concluir que o exercício compartilhado da curatela, previsto no artigo 1.775-A do CCB, no caso, além de se mostrar plausível e conveniente, bem atende à proteção da interdita, tratando-se de medida que vai ao encontro da finalidade precípua do instituto da curatela, que é o resguardo dos interesses da incapaz.

Nesse sentido, chancela a jurisprudência desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. FILHA MAIOR. PORTADORA DE DEFICIÊNCIA INTELECTUAL. INTERDIÇÃO. CURATELA COMPARTILHADA. GENITORES. PREVISÃO LEGAL. POSSIBILIDADE. I - Revela-se possível o exercício da curatela compartilhada, conforme postulado pelos autores, que são pais da interdita, mormente considerando que esta passou a ser expressamente permitida no artigo 1.775-A do Código Civil Brasileiro, com o advento da Lei nº 13.146, de seis de julho de 2015. II - Além de se mostrar plausível e conveniente, no caso, a curatela compartilhada bem atende à proteção da interdita, tratando-se de medida que vai ao encontro da finalidade precípua do instituto da curatela, que é o resguardo dos interesses da incapaz, razão pela qual é de ser deferido o pleito. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. (TJGO. Apelação Cível nº 203853-45.2015.8.09.0175. Rel. Des. Alan S. de Sena Conceição. 5ª Câmara Cível. Julgado em 04/08/2016. DJe 2088 de 12/08/2016)

Deste modo, o provimento do recurso é medida que se impõe.

ANTE O EXPOSTO, conheço da apelação cível e, acolhendo o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, dou-lhe provimento , para reformar em parte a sentença atacada a fim de determinar o exercício compartilhado da curatela da interditada (...) pelas suas filhas (...), cuja forma deverá ser definida pelo juízo de origem.

É o voto.

Goiânia, 22 de março de 2021.

Desembargador ITAMAR DE LIMA

Relator

 

 


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