Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Jurisprudência TJMG - Regulamentação de visita de idoso. Processo de curatela. Direito de convivência familiar. Covid-19

quarta-feira, 30 de junho de 2021, 17h20

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DE FAMÍLIA - REGULAMENTAÇÃO DE VISITA DE IDOSO - DIREITO DE CONVIVÊNCIA FAMILIAR. 1 - O direito à convivência e participação na vida familiar está amparado pela Constituição da República em seu art. 230 e pelo Estatuto Idoso em seus artigos 3º e 10º, sendo dever do Estado, por meio de políticas públicas e da correta prestação jurisdicional, a garantia de sua efetivação. 2 - Inexistindo prova que fundamente de modo contrário, deve ser tutelado o direito do idoso à convivência familiar, independentemente da aferição de sua capacidade para a prática dos atos da vida civil e da consequente responsabilidade sobre a administração de seu patrimônio e finanças, em observância ao princípio do melhor interesse do idoso.(TJ-MG - AI: 10000210159463001 MG, Relator: Jair Varão, Data de Julgamento: 17/06/2021, Câmaras Cíveis / 3ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/06/2021).

 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DE FAMÍLIA - REGULAMENTAÇÃO DE VISITA DE IDOSO - DIREITO DE CONVIVÊNCIA FAMILIAR.

1 - O direito à convivência e participação na vida familiar está amparado pela Constituição da República em seu art. 230 e pelo Estatuto Idoso em seus artigos  e 10º, sendo dever do Estado, por meio de políticas públicas e da correta prestação jurisdicional, a garantia de sua efetivação.

2 - Inexistindo prova que fundamente de modo contrário, deve ser tutelado o direito do idoso à convivência familiar, independentemente da aferição de sua capacidade para a prática dos atos da vida civil e da consequente responsabilidade sobre a administração de seu patrimônio e finanças, em observância ao princípio do melhor interesse do idoso.

AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.21.015946-3/001 - COMARCA DE SETE LAGOAS - AGRAVANTE (S): S.S.A.B. - AGRAVADO (A)(S): J.V.A.B.

A C Ó R D Ã O

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. JAIR VARÃO

RELATOR.





DES. JAIR VARÃO (RELATOR)



V O T O

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão, proferida pelo juízo da Vara de Família da Comarca de Sete Lagoas que, nos autos da ação de regulamentação de visitas ajuizada por S. S. A. B. em face de J. V. A. B., indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, consistente na regulamentação provisória de visitas da requerente a seu genitor.

Em síntese de suas razões recursais, sustenta a autora, ora agravante, que seu pai, pessoa idosa, se encontra com dificuldades de locomoção e sua atual amásia não permite o acesso da filha ao pai, sem qualquer razão para tanto. Afirma que há uma ação de curatela em curso, mas que até a presente data não foi deferida curatela provisória e não se demonstra razoável aguardar o desembaraçar do feito para que a agravante possa ter contato com seu pai. Argumenta que a curatela não foi deferida por ainda estarem pendentes conclusões sobre qual pessoa seria a mais indicada para ser a curadora, objetivando os interesses do interditando. Assevera que o agravado se encontra atualmente com 86 anos de idade e, apesar de a agravante crer que ele ainda possui capacidade mental, ele ainda possui dificuldades de locomoção e encontra-se a mercê dos cuidados de sua amásia, que estranhamente não permite o acesso a residência.

Nestes termos, pugna pela antecipação de tutela recursal e, no mérito, o provimento do recurso, para fixar regime de visitas provisórias da agravante em relação ao pai.

Os autos foram distribuídos em regime de plantão, momento em que a i. Desa. Plantonista deferiu o pedido de tutela recursal, "possibilitando à autora ter seu genitor consigo em finais de semana alternados, pegando-o aos sábados às 09 horas, devolvendo-o no local onde reside, às 09 horas da segunda-feira seguinte".

Contraminuta ao agravo em documento de ordem 42, em óbvias infirmações.

Parecer da d. Procuradoria Geral de Justiça em documento de ordem 48, opinando pelo provimento do recurso.

I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.



II - JUÍZO DE MÉRITO

Cinge-se a presente controvérsia recursal em aferir o direito da filha à visitação e convivência com seu genitor, idoso com 86 anos e capacidade reduzida em razão de enfermidade.

Sobre este tema, a Constituição da República prevê:

Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.

Ainda, o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) prevê:

Art. 3o É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.



Art. 10. É obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis.

(...)

V - participação na vida familiar e comunitária;

O direito à convivência e participação na vida familiar está amparado na legislação específica, bem como no texto constitucional, sendo dever do Estado, por meio de políticas públicas e da correta prestação jurisdicional, a garantia de sua efetivação.

No caso dos autos, a ação foi intentada com intuito de discutir não as questões patrimoniais inerentes à possível declaração de incapacidade para a prática dos atos da vida civil - que será discutida no bojo da ação própria de interdição, proposta pela companheira do agravado, na qual a agravante figura como parte, enquanto terceira interessada -, mas sim, quanto ao direito de convivência do idoso com sua filha.

Verifica-se a existência de atrito na convivência entre a filha do idoso e a companheira deste, sendo que sua origem está relacionada a questões financeiras, mais precisamente, em razão da discordância com o repasse de valores recebidos a título de benefício por aposentadoria. Ainda, verifica-se que foi reconhecido pelo agravado a ocorrência de restrição ao direito de convivência, justificada pela pandemia de COVID-19.

Contudo, inexistem nos autos provas quanto à dificuldade especificamente no relacionamento entre pai e filha, bem como restam ausentes indicadores de que a conduta da agravante represente uma ameaça à integridade física e também psíquica do idoso. Deste modo, não há elementos que justifiquem a manutenção da distância, sendo certo presumir que a presença e o afeto típicos da relação familiar tendem a ser benéficos para a saúde física e mental do idoso.

Neste sentido, considerando que o objeto da presente ação restringe-se tão somente à tutela do direito à convivência familiar, afastada a discussão sobre fatores e questões patrimoniais, entendo que, para preservação do melhor interesse do idoso, faz-se necessária a tutela jurisdicional do direito à visitação e convivência, com vistas à garantir o bem estar e acolhimento deste.

Ainda, no que concerne à justificativa para restrição do convívio em razão da pandemia de COVID-19, entendo que não merece prosperar. Em consulta ao sítio eletrônico da Prefeitura Municipal de Sete Lagoas1, foi verificado que a previsão para vacinação de idosos com 86 anos era para o dia 22/03/2021, sendo certo que, ainda que se considerasse o prazo entre a primeira e a segunda dose da vacina, à esta época do ano, o idoso já deveria estar devidamente imunizado. Por tal razão, não se verifica óbice à convivência deste com seus familiares, posto que não há provas de que esta representa risco real à sua saúde física, obviamente, desde que respeitados os protocolos e diretrizes sanitárias vigentes.

Nestes termos, entendo que os demais fatores que podem interferir na regulamentação da visitação entre pai e filha serão apurados na fase de instrução probatória, devendo, neste momento processual, em razão da necessidade de se resguardar os interesses e direitos do idoso, ser confirmada a tutela que concedeu o direito à visitação nos termos pretendidos pela agravante, posto que não existiu impugnação específica a tais termos.



III - DISPOSITIVO

Pelo exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO para confirmar a tutela anteriormente concedida e garantir à agravante o direito de ter seu genitor consigo em finais de semana alternados, pegando-o aos sábados às 09 horas, devolvendo-o no local onde reside, às 09 horas da segunda-feira seguinte.

Custas ao final.

DES. MAURÍCIO SOARES - De acordo com o (a) Relator (a).

JD. CONVOCADA LUZIA PEIXÔTO - De acordo com o (a) Relator (a).



SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO"

 


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