Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

STF decide sobre abate de animais apreendidos, competência para legislar sobre meio ambiente e outros temas

segunda-feira, 13 de abril de 2020, 15h01

Decisão: Trata-se de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS) em relação à interpretação que vem sendo conferida aos artigos 25, §§1º e 2º (com redação conferida pela Lei 13.052/2014) e art. 32 da Lei 9.605/1998, bem como os artigos 101, 102 e 103 do Decreto 6.514/2008, por parte de órgãos judiciais e administrativos, de modo a possibilitar o abate de animais apreendidos em situação de maus-tratos. Sustenta o autor que a presente ação busca resguardar a aplicação dos preceitos fundamentais contidos nos artigos 5º, inciso II, e art. 225, §1º, inciso VII, da Constituição Federal, para que seja excluída a interpretação inconstitucional dos citados dispositivos legais que permita o abate de animais apreendidos. (...) No caso em análise, o Partido requerente demonstrou a existência de decisões judiciais autorizando o abate de animais apreendidos em situação de maus-tratos, em interpretação da legislação federal que viola a norma fundamental de proteção à fauna, prevista no art. 225, §1º, VII, da CF/88. Juntou, ainda, decisão que impediu o abate nessas situações, demonstrando a existência de relevante controvérsia constitucional. (...) De igual maneira, parece difícil de conceber que o constituinte, ao proteger a vida de espécies naturais em face da sua ameaça de extinção, estivesse a promover unicamente a proteção de algum valor instrumental de espécies naturais; pelo contrário, deixou transparecer, em vista de tal consagração normativa, uma tutela da vida em geral nitidamente não meramente instrumental em relação ao ser humano, mas numa perspectiva concorrente e interdependente. Especialmente no que diz com a vedação de práticas cruéis contra os animais, o constituinte revela de forma clara a sua preocupação com o bem-estar dos animais não humanos e a refutação de uma visão meramente instrumental da vida animal. A CF88 também traz de forma expressa no mesmo dispositivo a tutela da função ecológica da flora e da fauna, o que dá a dimensão de sistema ou ecossistema ambiental, no sentido de contemplar a proteção jurídica ampla e integrada dos recursos naturais e da Natureza em si. Dessa forma, ao que parece, a ordem constitucional está a reconhecer a vida do animal não humano e a Natureza em geral como um fim em si mesmo, de modo a superar ou ao menos relativizar o antropocentrismo kantiano.” (FENSTERSEIFER, Tiago; SARLET, Ingo Wolfgang. Direito Constitucional Ambiental. 3 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2013.) A doutrina também destaca que a proteção constitucional abrange tanto os animais silvestres (selvagens) como os domésticos ou domesticados (CANOTILHO, J.J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coords.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2. ed. 2018 p. 887) Esta Corte inclusive já decidiu, em diversos precedentes, sobre a proibição de práticas cruéis contra os animais (RE n. 153.531/8/SC, ADIn. n. 1.856-6/RJ, ADIn n. 2.514-7/SC e ADIn. 3.776/RN). No julgamento da ADIn n. 2.514-7/SC, que tratava da inconstitucionalidade das denominadas “rinhas de galo”, o Ministro Eros Grau registrou que “ao autorizar a odiosa competição entre galos, o legislador estadual ignorou o comando contido no inciso VII do §1º, do artigo 225 da Constituição do Brasil, que expressamente veda práticas que submetam os animais a crueldade”. A legislação infraconstitucional segue a mesma linha de proteção ao bem-estar dos animais apreendidos em situação de risco. Nesse sentido, o art. 25 da Lei 9.605/98 prevê que os animais apreendidos em autos de infração ambiental serão “prioritariamente libertados em seu habitat”. Não sendo essa medida viável ou recomendável por questões sanitárias, a norma legal prevê que as autoridades competentes devem entregar os espécimes a “jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, para guarda e cuidados sob a responsabilidade de técnicos habilitados”. (...) Nesse sentido, colacionou aos autos decisão proferida por magistrado que autorizou o abate de “galos de rinha” apreendidos em situação de maus-tratos (eDOC 2, p. 100-103). Na decisão proferida, o Juízo sentenciante constatou a existência de déficits estruturais e financeiros para a manutenção adequada dos animais, mesmo após a apreensão pelas autoridades competentes. Com base nesse contexto, considerou que “a permanência no estado em que se encontram viola, ainda mais, o Direito Constitucional Fundamental à adequada proteção dispensada ao meio ambiente” (eDOC 2, p. 100-103). Para deferir o abate, o magistrado invocou a norma contida no art. 15 da Portaria 62/2018 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. É certo que os problemas estruturais e financeiros mencionados na decisão judicial são relevantes. Contudo, tais questões não autorizam o abate dos animais, mas sim o uso dos instrumentos acima descritos, quais sejam a soltura em habitat natural ou em cativeiros, a doação a entidades especializadas ou a pessoas habilitadas e inclusive o leilão. Percebe-se, portanto, que a autoridade judicial se utilizou da norma de proteção aos animais em sentido inverso ao estabelecido pela Constituição, para determinar a destruição e o abate das aves apreendidas. Em outro caso trazido aos autos, a magistrada responsável por investigação por crimes de maus-tratos decretou medida de busca e apreensão, autorizando a doação dos animais apreendidos “para consumo humano ou abate para descarte”, consignando, ainda, que “na dúvida, deverá o animal ser abatido para descarte, a fim de evitar qualquer prejuízo à saúde humana” (eDOC 2, p. 109-111). Nesses dois casos, o que se observa é a instrumentalização da norma de proteção constitucional à fauna e de proibição de práticas cruéis, com a adoção de decisões que violam o art. 225, §1º, VII, da CF/88. (...) Dispositivo: Ante o exposto, com base no art. 5º, §1º, da Lei 9.882/99, e art. 21, V, do RISTF, defiro a medida cautelar pleiteada para: a) determinar a suspensão de todas as decisões administrativas ou judiciais, em âmbito nacional, que autorizem o sacrifício de animais apreendidos em situação de maus-tratos; b) reconhecer a ilegitimidade da interpretação dos arts. 25, §§1º e 2º da Lei 9.605/1998, bem como dos artigos 101, 102 e 103 do Decreto 6.514/2008 e demais normas infraconstitucionais, que determina o abate de animais apreendidos em situação de maus-tratos. Solicitem-se informações, no prazo de 10 (dez) dias, nos termos do art. 6º da Lei 9.882/99, às autoridades judiciais responsáveis pelos atos questionados, ao Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura e Ibama. Em seguida, cite-se o Advogado-Geral da União e abra-se vista dos autos à PGR, pelo prazo comum de 5 (cinco) dias (art. 103, §3º, da CF/88 e art. 7º, parágrafo único, da Lei 9.882/99). Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Brasília, 27 de março de 2020. Ministro Gilmar Mendes Relator. (STF - ADPF 640 MC, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 27/03/2020, publicado em 01/04/2020)

 




AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 2. DIREITO AMBIENTAL E CONSTITUCIONAL. 3. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA LEGISLAR SOBRE ASSUNTOS DE INTERESSE LOCAL: AGROTÓXICO. COMPETÊNCIA IMPLÍCITA E SUPLEMENTAR. INTERESSE LOCAL NA EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO. 4. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO REGIMENTAL. SEM FIXAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA.
Relatório: No agravo regimental, sustenta-se que o município, ao proibir a produção, comércio e consumo de mercadorias que contenham substâncias nocivas, no caso, agrotóxicos e outros biocidas, extrapola sua competência ao editar lei que afronta o que já foi estabelecido pelo Estado e pela União. Argumenta-se ainda que o município confunde competência para legislar sobre matéria ambiental com competência para proteger o meio ambiente, de forma que não foi comprovado o interesse local capaz de justificar de forma suficiente e clara a edição de lei de proibição do uso de agrotóxicos. (...) Decisão: Como já demonstrado na decisão ora agravada e na jurisprudência supracitada, o município, além da competência político-administrativa, possui competência legislativa para estabelecer diretrizes de proteção ao meio ambiente e de combate à poluição. Há que se observar, ainda, que a legislação em questão é o cumprimento da competência implícita estipulada no artigo 30, I, da Constituição Federal. Logo, sendo o município um dos maiores produtores de uva do Estado, atividade suscetível ao uso do defensivo mencionado, é cristalino o interesse local. Assim, não ocorre usurpação de competência da União e do Estado para legislar sobre agrotóxicos e biocidas, mas tão somente o exercício da competência suplementar concedida ao Município que, como demonstrado, possui interesse fundamental na edição da legislação. Ante o exposto, nego provimento ao recurso e, tendo em vista a ausência de fixação de honorários pela origem, deixo de aplicar o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC. 
(STF - Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 761.056/SC, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 13/03/2020, publicado em 20/03/2020)

 




AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENAL. CRIME AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO INC. IX DO ART. 93 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AOS INCS. LIV E LV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA: INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
Relatório: (...) O recorrente salienta que “ a discussão emergente no processo é aquela enfocada no venerando acórdão: a irretroatividade das disposições do Código Florestal a situações pretéritas, por contrariedade aos direitos ambientais adquirido e a coisa julgada. Trata-se de discussão de natureza eminentemente infraconstitucional ” (fl. 13, e-doc. 15). Pondera que “a controvérsia é atinente à retroatividade ou não dos arts. 4º, IX, e 18, § 4º, da Lei n. 12.651, de 2012, que tratam, respectivamente, da área de preservação permanente no topo de morros, montes, montanhas e serras, e do registro da reserva legal” (fl. 17, e-doc. 15). Pontua que “a solução dada no venerando acórdão foi a aplicação da lei vigente ao tempo dos fatos (tempus regit actum), refutando a aplicação retroativa do Novo Código Florestal, o que significa a consagração do quanto disposto no art. 6º do Decreto-lei n. 4.657/42, e que, reflexamente, sublima o não retrocesso ambiental. Não se discutiu constitucionalidade desses dispositivos legais. Eles não foram confrontados com norma constitucional. Cuidou-se, apenas, de impedir sua aplicabilidade imediata tendo em conta o princípio tempus regit actum, de modo a não se permitir a aplicação dos dispositivos do novo Código Florestal a fatos pretéritos” (fl. 18, e-doc. 15). Reforça que “é processo de interpretação de direito intertemporal, e não juízo de constitucionalidade. A cláusula de reserva de plenário somente é afrontada quando a norma aplicável à espécie for afastada sob alegação de incompatibilidade com a Constituição da República, o que não se deu na espécie ” (fl. 18, e-doc. 15). Decisão: 1. Razão jurídica não assiste ao agravante. 2. No voto condutor do acórdão recorrido, o Ministro Relator Mauro Campbell Marques afirmou que “o acórdão recorrido, ao assim decidir, divergiu da jurisprudência desta Corte, segundo a qual, em matéria ambiental, deve prevalecer o princípio tempus regit actum, de forma a não se admitir a aplicação das disposições do novo Código Florestal a fatos pretéritos, sob pena de retrocesso ambiental” (fl. 34, vol. 5). (...) 5. Este Supremo Tribunal tem entendido ser matéria constitucional a aplicação retroativa da Lei n. 12.651/2012 (...) Pelo acórdão recorrido, ao se julgar a controvérsia não se observou o princípio da reserva de plenário. 6. Os argumentos do agravante, insuficientes para modificar a decisão agravada, demonstram apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional. 7. Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental. 
(STF - Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 1.216.014, Relator(a): Min. CARMEN LÚCIA, julgado em 14/02/2020, publicado em 28/02/2020)

 




EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENAL. CRIME AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO INC. IX DO ART. 93 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AOS INCS. LIV E LV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA: INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. Relatório: (...) A recorrente assevera que “não há, na sentença, nem no Acórdão, nenhuma avaliação relativa ao DOLO da Recorrente, ou mesmo ao conhecimento dela de que a área objeto do litígio tratava-se de área que não pudesse manejar” (fl. 6, e-doc. 114). Pleiteia “que o Colendo Supremo Tribunal Federal declare a nulidade do Acórdão e da Sentença de 1º grau, em virtude de não ter analisado e acatado a tese de defesa apresentada em alegações finais e em grau recursal relativa ao erro de tipo invencível” (fl. 6, e-doc. 114). Requer a reconsideração da decisão agravada ou o provimento do presente recurso. Decisão: (...) 4. No julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 748.371, (Tema 660), Relator o Ministro Gilmar Mendes, este Supremo Tribunal assentou inexistir repercussão geral na alegação de contrariedade aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal quando necessário o exame da legislação infraconstitucional. 5. Os argumentos da agravante, insuficientes para modificar a decisão agravada, demonstram apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional. 6. Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental. (STF - Ag.Reg. no Recurso Extraordinário com Agravo 1.245.374, Relator(a): Min. CARMEN LÚCIA, julgado em 14/02/2020, publicado em 28/02/2020)

 


 


topo