Jurisprudência TJAC - Indenização por danos morais. Abandono afetivo. Montante indenizatório. Redução. Construção de vínculo afetivo entre pai e filho
segunda-feira, 22 de março de 2021, 17h15
APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. CIVIL E PROCESSO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PEDIDO QUE NÃO DECORRE DAS RAZÕES RECURSAIS. EFEITO DEVOLUTIVO. CONHECIMENTO PARCIAL DA INSURGÊNCIA PARCIAL. MONTANTE INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO COM BASE NA CONDIÇÃO PESSOAL DAS PARTES, EXTENSÃO DO DANO E GRAU DE CULPA. PATAMAR ELEVADO. REDUÇÃO. PROPÓSITO MAIOR DA AÇÃO. CONSTRUÇÃO DE VÍNCULO AFETIVO ENTRE PAI E FILHO. 1. O recurso de apelação devolve ao Tribunal apenas a matéria efetivamente impugnada, somente se podendo julgar o que está contido nas razões recursais, restringindo-se o pedido ao que efetivamente estiver em discussão (tantum devolutum quantum appellatum). Acolhimento de preliminar de ausência de dialeticidade. Conhecimento parcial do recurso. 2. À míngua de critérios legais para a fixação do valor da compensação dos danos morais, devem ser considerados o grau de culpa do agente causador do dano, a extensão dos danos na vida da vítima e a situação financeira pessoal das partes, além de ser o suficiente para a inibição de novos atos danosos e ressarcir o prejuízo sem o enriquecimento sem causa da vítima. 3. O abandono afetivo, não obstante configurado e admitido pelo genitor e com efeitos danosos comprovados na vida da vítima, pode e deve ser reparado com a construção de vínculo afetivo com o filho, uma vez ser este ainda adolescente, em fase de desenvolvimento de caráter. 4. A indenização não pode ser um fim em si mesma, de sorte que deve servir muito mais como um alerta ao genitor ausente para que se aproxime do seu filho. De outra banda, não pode ser entendida como uma espécie de premiação à mãe que pratica atos de alienação parental. 5. Condições pessoais das partes que militam pela redução do valor estabelecido na sentença, que passa a ser de cinco mil reais. 6. Recurso principal parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. Recurso adesivo conhecido e desprovido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0703101-41.2016.8.01.0001, "DECIDE A SEGUNDA CÂMARA CÍVEL CONHECER, EM PARTE, DO APELO E NESTA, PROVÊ-LO. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DO (A) DES (A) RELATOR (A). UNÂNIME" e das mídias digitais gravadas.(TJAC - APL: 07031014120168010001 AC 0703101-41.2016.8.01.0001, Relator: Regina Ferrari, Data de Julgamento: 23/06/2020, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 25/06/2020).
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ACRE
Tribunal de Justiça - Segunda Câmara Cível
Acórdão n.º : 8.843
Classe : Apelação n.º 0703101-41.2016.8.01.0001
Foro de Origem : Rio Branco
Órgão : Segunda Câmara Cível
Relatora : Des.ª Regina Ferrari
Apelante :
Advogado : Almir Antonio Pagliarini (OAB: 2680/AC)
Apelada : (...) (Representado por sua mãe)
D. Pública : Celia da Cruz Barros Cabral Ferreira (OAB: 2466/AC)
Apelante : (...) (Representado por sua mãe)
D. Pública : Celia da Cruz Barros Cabral Ferreira (OAB: 2466/AC)
Apelado :
Advogado : Almir Antonio Pagliarini (OAB: 2680/AC)
Assunto : Direito Civil
APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. CIVIL E PROCESSO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PEDIDO QUE NÃO DECORRE DAS RAZÕES RECURSAIS. EFEITO DEVOLUTIVO. CONHECIMENTO PARCIAL DA INSURGÊNCIA PARCIAL. MONTANTE INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO COM BASE NA CONDIÇÃO PESSOAL DAS PARTES, EXTENSÃO DO DANO E GRAU DE CULPA. PATAMAR ELEVADO. REDUÇÃO. PROPÓSITO MAIOR DA AÇÃO. CONSTRUÇÃO DE VÍNCULO AFETIVO ENTRE PAI E FILHO.
1. O recurso de apelação devolve ao Tribunal apenas a matéria efetivamente impugnada, somente se podendo julgar o que está contido nas razões recursais, restringindo-se o pedido ao que efetivamente estiver em discussão (tantum devolutum quantum appellatum). Acolhimento de preliminar de ausência de dialeticidade. Conhecimento parcial do recurso.
2. À míngua de critérios legais para a fixação do valor da compensação dos danos morais, devem ser considerados o grau de culpa do agente causador do dano, a extensão dos danos na vida da vítima e a situação financeira pessoal das partes, além de ser o suficiente para a inibição de novos atos danosos e ressarcir o prejuízo sem o enriquecimento sem causa da vítima.
3. O abandono afetivo, não obstante configurado e admitido pelo genitor e com efeitos danosos comprovados na vida da vítima, pode e deve ser reparado com a construção de vínculo afetivo com o filho, uma vez ser este ainda adolescente, em fase de desenvolvimento de caráter.
4. A indenização não pode ser um fim em si mesma, de sorte que deve servir muito mais como um alerta ao genitor ausente para que se aproxime do seu filho. De outra banda, não pode ser entendida como uma espécie de premiação à mãe que pratica atos de alienação parental.
5. Condições pessoais das partes que militam pela redução do valor estabelecido na sentença, que passa a ser de cinco mil reais.
6. Recurso principal parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. Recurso adesivo conhecido e desprovido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0703101-41.2016.8.01.0001, “DECIDE A SEGUNDA
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CÂMARA CÍVEL CONHECER, EM PARTE, DO APELO E NESTA, PROVÊLO. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DO (A) DES (A) RELATOR (A). UNÂNIME” e das mídias digitais gravadas.
Rio Branco, 23/06/2020.
Desembargadora Regina Ferrari
Relatora
R E L A T Ó R I O
Dário Lopes Figueiredo , devidamente qualificado e representado, interpôs Apelação (pp. 571-574) em face de sentença prolatada pelo Juízo da 4.ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, que, nos autos do Processo n.º 0703101-41.2016.8.01.0001, julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida pelo autor, (...), menor representado por sua genitora, Rosimar Carioca Pena, relacionada com indenização por danos morais advindos de abandono afetivo.
A decisão recorrida (pp. 561-564) ostenta o seguinte dispositivo:
Ante o exposto, acolho em parte o pedido formulado na peça inicial, e condeno a parte ré a pagar a autora o valor de R$ 15.000,00, a título de danos morais, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da prolatação desta Sentença, e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.
Resolvo o mérito da causa, nos moldes do art. 487, inc. I, do CPC.
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Transitado em julgado, arquivem-se os autos.
Intimem-se. (p. 564)
Nas razões do apelo principal (pp. 571-574), o recorrente, (...), pugnou, preliminarmente, pela concessão da assistência judiciária gratuita, aduzindo não possuir condições financeiras de arcar com as despesas processuais.
Em seguida, assevera que o valor da indenização fixado na sentença (quinze mil reais) extrapola as condições de pagamento do apelante, uma vez que corresponde a cinco vezes ao montante do seu salário líquido.
Assere que paga pensões alimentícias a três filhos, cujo valor da maior delas (R$ 1.355,44 mensais) vai justamente para o autor da ação, sendo esta superior à soma das outras duas (R$ 682,86 e 409,72), consoante documentação anexa.
Por fim, requer o conhecimento e o provimento de seu apelo para que os pedidos constantes da ação sejam julgados improcedentes, assim como deferida a AJG por não possuir condições de arcar com os custos do processo.
Juntou os documentos de pp. 575-582.
Em contrarrazões (pp. 585-593), a parte autora, (...), também pleiteou a gratuidade da justiça por se declarar hipossuficiente. Também, de forma preambular, suscitou preliminar de ausência de dialeticidade, uma vez que o apelante apenas menciona a sua suposta ausência de condições de pagar o valor da condenação, passando ao largo das razões contidas na sentença.
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Quanto ao mérito, defende a sentença recorrida apontando existir, no caso concreto, todos os requisitos da responsabilidade civil por abandono afetivo, de sorte que a indenização é de rigor, porquanto o réu inobservou os deveres de prestar assistência ao seu filho que vão além do auxílio material, não participando da criação e educação do menor.
Descuidou, com isso, dos aspectos afetivos de cuidado, amor, carinho e outros, previstos no ECA e na CRFB, havendo construção jurisprudencial (STJ, REsp 115242/SP) que reconhece isso como sendo conduta geradora de dano moral que deve ser indenizado.
Assim, requer o desprovimento do apelo.
A parte autora, (...), interpôs recurso adesivo (pp. 594-600) , no qual, em terreno preliminar, pleiteia a assistência judiciária gratuita.
No mérito, argumenta que o valor arbitrado como indenização pelos danos morais (quinze mil reais) não está proporcional com a extensão dos danos causados ao autor, pela conduta do réu, seu genitor, devidamente comprovados no relatório psicossocial.
Além disso, segundo diz, deve-se levar em consideração a repercussão do dano na esfera de intimidade da vítima, o caráter punitivo-pedagógico da indenização e a capacidade econômico-financeira do ofensor.
Destaca, nesse eito, que o réu violou deveres de natureza familiar, sendo omisso em relação à criação de seu filho, causando dor, tristeza e outros sentimentos que afetam a dignidade da pessoa humana e prejudicam o intelecto e a moral. Quanto à capacidade econômica, observa -5
Endereço: Rua Tribunal de Justiça, s/n, Via Verde, CEP 69.915-631, Tel. 68 3302-0444/0445, Rio Branco-AC - Mod. 500244 - Autos n.º 0703101-41.2016.8.01.0001 se que o ofensor é servidor da Universidade Federal do Acre (UFAC) e ainda é capaz de criar e educar seus dois outros filhos.
Conclui pedindo o provimento do recurso adesivo para que o valor arbitrado na sentença (quinze mil reais) seja majorado.
Quando da chegada dos autos nesta instância revisora, determinou-se, por meio do decisum de pp. 605-608, a intimação do recorrente, (...), para a apresentação de documentos visando a comprovação da sua alegada hipossuficiência econômica.
Em razão do seu silêncio (p. 610), o pleito de AJG restou indeferido, sendo fixado prazo para o recolhimento do preparo (p. 611). Providência essa realizada, conforme se vê nos documentos de pp. 614-616.
Instado a manifestar-se, o Ministério Público, às pp. 623-627, opinou pelo acolhimento da preliminar, suscitada em contrarrazões, de ausência de impugnação específica do recurso principal, haja vista que direcionou as razões da insurgência somente para o valor fixado como indenização, de sorte que somente esta matéria deve ser conhecida.
Com relação ao mérito do apelo principal, menciona que a alegação do réu, Dário, de que não possui condições de pagar o valor estipulado depende de prova que deveria ter sido produzida na instância de origem, mas não o foi. Portanto, essa insurgência deve ser parcialmente conhecida e, nessa extensão, desprovida.
A respeito do recurso adesivo, pontua que o fato de o réu ser servidor da UFAC e pagar pensão a dois outros filhos é insuficiente para modificar a sentença,
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inexistindo erro judicial.
Conclui, desta maneira, opinando pela manutenção do decisum recorrido.
É o relatório.
V O T O
Inicialmente, quanto aos pressupostos de admissibilidade, registre-se que, a despeito de o recurso principal, manejado pelo réu (...), conter pedido de reforma total da sentença para que os pedidos autorais sejam julgados totalmente improcedentes, suas razões trataram apenas do valor fixado como reparação pelos danos morais.
A ser assim, diante dos termos do caput do art. 1.013 do CPC, para quem "a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada", a análise apenas se debruçará sobre o dito montante. Essa é a orientação seguida pela jurisprudência:
TJAC APELAÇÃO. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. PEDIDOS QUE NÃO DECORREM DAS RAZÕES RECURSAIS. NÃO CONHECIMENTO. EFEITO DEVOLUTIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. MATÉRIA ABORDADA. FIXAÇÃO EM PATAMAR SUPERIOR ÀS MÉDIAS DO MERCADO À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO. ABUSIVIDADE. REDUÇÃO. PARCIAL CONHECIMENTO DO APELO. PROVIMENTO DA PARTE CONHECIDA.
1. O recurso de Apelação devolve ao Tribunal apenas a matéria efetivamente impugnada, somente se podendo julgar o que está contido nas razões recursais, restringindo-se o pedido ao que efetivamente estiver
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em discussão (tantum devolutum quantum appellatum). 2. Estando demonstrado pelo contrato revisado que a taxa dos juros remuneratórios está acima da média praticada no mercado, mister sua limitação à taxa média de mercado na data da contratação.
3. Apelo parcialmente conhecido. Na parte conhecida, provido.
(Relatora: Regina Ferrari; Comarca: Rio Branco; Número do Processo: 0712507-86.2016.8.01.0001; Órgão julgador: Segunda Câmara Cível; Data do julgamento: 07/11/2017; Data de registro: 10/11/2017)
Portanto, conheço parcialmente do apelo formulado pelo réu Dário Lopes Figueiredo .
Quanto ao recurso adesivo, interposto por (...), dele conheço por estarem presentes os pressupostos de admissibilidade.
Portanto, esta instância revisora deve analisar apenas o tema relativo ao montante estabelecido como indenização por danos morais experimentados pelo autor, (...)
Nesse eito, deve ser ressaltada a inexistência de critérios legais hábeis a orientar a conduta do juiz. Contudo, três fatores devem ser considerados: grau de culpa do agente causador do dano; repercussão do ato na vida do ofendido; e situação financeira de ambas as partes. Não se pode esquecer, também, o duplo caráter indenizatório, quais sejam: inibir atos semelhantes àquele que deu origem à demanda e ressarcir o prejuízo causado, sem ensejar o enriquecimento da vítima.
Nesse sentido:
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TJDFT CONSTITUCIONAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABANDONO MATERIAL E AFETIVO DA FILHA POR PARTE DO GENITOR. TRAUMA PSICOLÓGICO CARACTERIZADO. EXISTÊNCIA DE CONCAUSALIDADE. AFASTAMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL. INOCORRÊNCIA. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO.
1. No âmbito das relações familiares, para a configuração da responsabilidade civil, no caso de abandono afetivo, deve ficar comprovada a conduta omissiva ou comissiva do genitor, quanto ao dever jurídico de cuidado com o filho, bem como o dano, caracterizado pelo transtorno psicológico sofrido e o nexo causal entre o ilícito e o dano suportado, nos termos do artigo 186 do Código Civil.
2. Em hipóteses excepcionais, quando configuradas trauma psicológico decorrente do descaso do genitor perante a prole, é cabível indenização por abandono afetivo, em virtude do descumprimento legal do dever jurídico de cuidado, necessários à adequada formação psicológica e inserção social da prole.
3. Demonstrado que o genitor, por omissão voluntária, deixou de observar o dever jurídico de cuidado, previsto nos artigos 227 e 229, da Constituição Federal e no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, causando trauma psicológico à autora, conforme laudo pericial produzido nos autos, tem-se por caracterizado ato ilícito passível de indenização.
4. A existência de concausas, por si só, não elide o nexo causal, tampouco afasta a responsabilidade civil daquele que, com sua conduta ilícita, causou danos a outrem, razão pela qual o genitor omisso deve responder pelos danos experimentados pela prole, na proporção em que concorreu para o evento danoso.
5. Para a fixação do quantum indenizatório a título Tribunal de Justiça - Segunda Câmara Cível de danos morais, deve o magistrado levar em consideração as condições pessoais das partes, a extensão do dano experimentado, bem como o grau de culpa do réu para a ocorrência do evento.
6. Recurso de Apelação conhecido e parcialmente provido.
(Acórdão 1163645, 20140112004114APC, Relator: NÍDIA CORRÊA LIMA, 8.ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 21/3/2019, publicado no DJE: 9/4/2019. Pág.: 504/506)TJDFT CONSTITUCIONAL. CIVIL. PROCESSO CIVIL. FAMÍLIA. AFETO. VALOR JURÍDICO. DIREITO DA PERSONALIDADE. ABANDONO AFETIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REQUISITOS. PRESENTES. DANO MORAL. CONFIGURADO. ÔNUS DA PROVA. COMPROVAÇÃO.
1. A tutela jurídico-estatal da família deve considerar as especificidades e idiossincrasias próprias dos indivíduos que compõem o espaço familiar, partindo-se daí para uma compreensão ampla do cenário em que seus membros estão inseridos, para que o escopo social da jurisdição de eliminar os conflitos e gerar a pacificação social seja compreendido pelos litigantes que possuem laços familiares.
2. Os limites do exame jurisdicional para a análise da ocorrência de abandono afetivo estão delimitados pela verificação objetiva do cumprimento ou não da obrigação jurídica de cuidados de criação e educação, dentro das possibilidades factíveis dos membros do núcleo familiar, nos termos do artigo 227 da Carta Magna.
3. Denota-se a relevância da proteção jurídica do afeto como direito da personalidade de cada indivíduo, razão pela qual a lesão ao referido direito configura reprovável ato ilícito que carece de efetiva compensação.
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4. No âmbito das relações familiares, para a configuração da responsabilidade civil do genitor, no caso de abandono afetivo, deve ficar comprovada a conduta omissiva ou comissiva deste quanto ao dever jurídico de convivência com o filho; o dano, caracterizado pelo transtorno psicológico sofrido, e o nexo causal entre o ilícito e o dano suportado, nos termos do artigo 186 do Código Civil.
5. Presentes os elementos de prova que imputam o dano moral pretendido, deve-se reconhecer a responsabilidade civil do pai em razão de abandono afetivo de filho.
6. Diante da inexistência de regra legal que norteie o cálculo do valor da compensação por danos morais, incumbe ao magistrado pautar sua avaliação baseada no grau de culpa do agente causador do dano; na repercussão do ato na vida da parte autora, na situação financeira de ambas as partes, sem se olvidar do duplo caráter indenizatório, quais sejam: inibir atos semelhantes àquele que deu origem à demanda e ressarcir o prejuízo causado sem ensejar o enriquecimento da vítima.
7. Recurso conhecido e parcialmente provido.
(Acórdão 1224147, 00069837220168070005, Relator: MARIA DE LOURDES ABREU, 3.ª Turma Cível, data de julgamento: 11/12/2019, publicado no PJe: 21/1/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
Na hipótese dos autos, por ocasião da elaboração dos dois relatórios que constam no caderno processual (psicológico, às pp. 394-409, e de estudo social, às pp. 419-427), as profissionais que os subscreveram perceberam o distanciamento entre o apelante, Dário Lopes Figueiredo, e o filho, Carlos Eduardo Carioca Figueiredo:
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Verificou-se que remete-se [referindo-se ao réu (...) a este filho (...) com distanciamento afetivo, e de modo inconsciente refere-se aos filhos realizando distinção da filiação, ferindo o princípio da igualdade entre filhos, posto que, quando levado a pensar sobre a possibilidade de manter convivência com o infante em finais de semana para passear afirmou, "no final de semana é difícil eu sair de casa, não levo nem 'meus filhos' por causa da violência" (sic), ficando nítida uma designação discriminatória do infante em detrimento da prole que considera do seu "núcleo familiar", demonstrando que não há interesse ou disponibilidade de estar com o filho aos finais de semana. [...] Somado a isto não se mostrou desejoso de que o filho compartilhe do seu convívio familiar natural, "não ser se minha esposa ia aceitar isso" (sic), revelando que muito de seu comportamento omissivo quanto à convivência com o filho tem como motivação o receio de que haja interferência por parte da requerente em seu casamento [...]. (sic) (pp. 402-403)
Da relação paterno-filial com o menor em análise demonstrou interesse em manter convivência com a criança, todavia sem mantê-lo em contato com sua família nuclear paterna (esposa e filhos de seus atual casamento), alegando que a genitora do menor ocasionou conflitos com sua atual esposa durante a visita dele para com o filho em estudo; tal situação teria contribuído para ele se afastar do filho. (p. 426)
Decerto que ambos os relatórios apresentam narrativas de eventos que demonstram que a mãe do menor colocou em diversas ocasiões obstáculos a uma aproximação maior entre pai e filho (alienação parental). Todavia, isso não pode ser utilizado pelo genitor para justificar o seu afastamento, uma vez que, se estivesse verdadeiramente
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Tribunal de Justiça - Segunda Câmara Cível interessado no infante, teria buscado meios, até mesmo judiciais, para resolver o problema.
Além disso, é inadmissível a intenção de alijar o menor Carlos Eduardo do convívio com os seus irmãos paternos, posto que inexiste subcategoria de filho, de forma que todos devem ser tratados igualmente, sendo saudável a convivência entre eles, independentemente das circunstâncias que envolveram o nascimento de cada um.
Desta feita, entendo como elevado o grau de culpa do causador do dano.Em relação às consequências dessa conduta, são incomensuráveis os efeitos deletérios que a ausência de convívio com o pai provoca numa criança, os quais, certamente, perduraram, em maior ou menor medida, por toda a vida.
Na situação em tela, o menor autor, embora tenha hoje onze anos de vida, já ostenta um histórico que demonstra possuir saúde que demanda atenção e cuidados especiais, a teor de vasta documentação que consta nos autos (pp. 27-280 e 315-324), sobremodo por possuir epilepsia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
Claro que tudo isso não pode ser imputado exclusivamente na conta da ausência de convívio com o pai.
Porém, uma relação mais próxima e com maior apoio redundaria em relevante melhora na saúde do menor, diminuindo-se as crises, os atendimentos ambulatoriais e o uso de medicamentos.
Necessário dizer, por outro lado, que não estamos a falar de vítima que esteja na vida adulta, com traumas emocionais já estabelecidos. Pelo contrário, o menor está no início da adolescência, em plena fase de desenvolvimento do caráter, de sorte que o convívio entre pai e filho, a despeito do que aconteceu no passado, pode ser construído, havendo tempo para que haja proximidade, carinho, respeito, cuidado e amor entre ambos.
Assim, os efeitos danosos do distanciamento, ou da inexistência de vínculos, podem ser minorados, a tempo de gerar benefícios para ambas as partes, inclusive na saúde do autor, que precisa de cuidados e atenção.
Por não estarmos diante de algo consolidado, já estabelecido, a presente ação deve servir muito mais ao propósito de chamar a atenção do genitor distante para a importância de buscar contato, num primeiro momento, e convívio, num segundo, com o seu filho, do que apenas a busca de uma reparação pecuniária por conta da ausência paterna.
Digo isso porque essa ação não pode ser entendida como uma espécie de "salvo-conduto" ao réu, a lhe permitir o completo distanciamento do filho a partir do pagamento de uma indenização.
A partir do presente julgamento, deve o genitor demonstrar efetivo interesse em conviver com o infante, interessando-se por todas as coisas relacionadas com este, sobremodo a sua saúde, bem-estar, educação, lazer, alimentação e outros. Da mesma forma, não pode haver qualquer tipo de tolerância para com eventuais e abjetos atos de alienação parental por parte da genitora do adolescente, devendo ela contribuir e respeitar o vínculo emocional que será construído por ambos, sem obstáculos ou interferências.
Reitero que o olhar deve ser para o futuro, para um novo tempo de estreitamento de laços, e não para as diferenças do passado.
Por essas razões, a indenização não pode ser um fim em si mesma, de sorte que, no caso dos autos, deve servir muito mais como um alerta ao genitor ausente para que se aproxime do seu filho. De outra banda, não pode ser entendida como uma espécie de premiação à mãe que pratica atos de alienação parental.
Nesse contexto, a quantia de quinze mil reais revela-se exagerada e deve ser minorada para que fique mais alinhada às circunstâncias acima alinhavadas.
Ademais, há de se considerar a capacidade econômica das partes e prestigiar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
O teor do documento de p. 577 revela que o apelante, (...), percebeu ganhos brutos, no mês de setembro/2019, no valor de R$ 8.579,61 (oito mil quinhentos e setenta e nove reais e sessenta e um centavos), mas o líquido ficou em R$ 3.387,05 (três mil trezentos e oitenta e sete reais e cinco centavos). Também merece menção o fato de ele possuir nove filhos ao todo.
Noutra banda, o menor (...) não se encontra em situação de penúria, uma vez que o seu pai vem pagando o valor de sua pensão mensal, estabelecida em R$ 1.355,44 (mil trezentos e quarenta e cinco reais e quarenta e quatro centavos).
Assim, entendo como razoável estabelecer a reparação pelos danos morais enfrentados pelo autor no montante de cinco mil reais.
Em face do exposto, acolhendo a preliminar de ausência de dialeticidade recursal, conheço parcialmente da insurgência formulada por (...) e, nessa extensão, dou-lhe provimento para diminuir a quantia estabelecida na sentença como indenização por danos morais, que passa a ser de cinco mil reais.
Via de consequência, conheço e nego provimento ao recurso adesivo interposto por (...)
Como o resultado do presente julgamento não altera a sucumbência estabelecida na sentença, inclusive por conta da Súmula 326 do STJ, deixo de majorar os honorários advocatícios.
É como voto .
D E C I S Ã O
Conforme consta da Certidão de Julgamento, a decisão foi a seguinte:
“DECIDE A SEGUNDA CÂMARA CÍVEL CONHECER, EM PARTE, DO APELO E NESTA, PROVÊ-LO. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DO (A) DES (A) RELATOR (A). UNÂNIME”.
Participaram do julgamento os Desembargadores Waldirene Cordeiro, Roberto Barros e Regina Ferrari.
Sara Cordeiro de Vasconcelos Silva
Secretária