Cientistas assustados: Estados Unidos registram a primeira extinção causada pelo aumento do nível do mar
por Matheus Manente
terça-feira, 16 de julho de 2024, 12h54

População de cactos arbóreos denominados Key Largo foi completamente extinta nos Estados Unidos, e a causa foi o aumento do nível do mar (imagem: Luke Padon)
O cacto arbóreo Key Largo (Pilosocereus Millspaughii) pode ser encontrado em algumas partes do mundo, inclusive em ilhas espalhadas pelo Caribe, como o norte de Cuba e partes das Bahamas. Nos Estados Unidos, o cacto está restrito a uma única população em Florida Keys, descoberta pela primeira vez em 1992 e monitorada desde então.
Ou melhor, estava. Pesquisadores descobriram recentemente que a população de Key Largos sumiu completamente, naquilo que pode ser a primeira extinção local de uma espécie devido ao aumento do nível do mar.
Pouco se sabe sobre estes raros cactos. Inicialmente, pensava-se que o Key Largo era uma população única do Pilosocereus Robinii, uma espécie também ameaçada de extinção. Ambos têm caules que podem atingir mais de 6 metros de altura; flores que cheiram a alho e refletem a luz da lua, atraindo morcegos polinizadores; e frutos vermelhos e roxos brilhantes chamam a atenção de pássaros e mamíferos.

Algumas das características da espécie, flores que cheiram a alho e frutos que variam entre vermelho e roxo brilhante. Morcegos, pássaros e mamíferos são atraídos. (imagem: Possley, J. et al)
No entanto, pesquisadores notaram diferenças entre ambas as espécies. O Key Largo possui tufos de pelos longos na base das flores e frutos, além de espinhos mais longos, o que sugeriu que os pesquisadores estavam lidando com uma espécie única. Em 2019, o pesquisador Alan Franck confirmou que a população de Key Largo era o único exemplo conhecido de Pilosocereus Millspaughii nos EUA.
A vida e morte da população de Key Largo nos Estados Unidos
O cacto arbóreo prosperou em um afloramento calcário baixo, perto da costa e cercado por manguezais. O local originalmente tinha uma camada distinta de solo e matéria orgânica que permitia o crescimento de cactos e outras plantas, mas as tempestades causadas por furacões e marés excepcionalmente altas erodiram esse material até que não restasse muito.
Plantas tolerantes ao sal, que anteriormente estavam restritas a outros locais, começaram lentamente a subir pelo afloramento, uma indicação de que os níveis de sal estavam aumentando - o que por si só já é desfavorável ao cacto.
Um estudo mostrou que os níveis de sal eram mais elevados no solo sob cactos mortos do que no solo sob cactos vivos, estabelecendo uma ligação clara entre a mortalidade dos cactos e o aumento da salinidade.
Em 2015, os pesquisadores perceberam que metade dos cactos haviam morrido, servindo de alimento para outras espécies. Inundações de água salgada causadas por marés particularmente altas nos anos anteriores limitaram a quantidade de água doce disponível para os mamíferos da região, que começaram a consumir o cacto para obter água.

Como estava claro que a população não sobreviveria, a equipe recuperou todo o material verde que pode na região. Depois, replantou em ambientes controlados. (imagem: Possley, J. et al)
Em 2017, o furacão Irma varreu o sul da Flórida, deixando grandes porções da região inundadas durante dias. As condições eram tão extremas que os biólogos tiveram que usar piscinas infantis de água doce para manter viva a vida selvagem local. Em 2019, marés reais deixaram grandes porções da ilha, incluindo o afloramento extremamente baixo, inundadas por mais de três meses.
O resultado é que, quando os pesquisadores foram monitorar a região em 2021, descobriram que restavam apenas seis caules de Key Largo, todos adoecidos. Como estava claro que a população não sobreviveria, a equipe recuperou tudo o que pode e replantou em estufas ou ambientes externos controlados.
Infelizmente, o cacto arbóreo de Key Largo pode ser um indicador de como outras plantas costeiras baixas responderão às mudanças climáticas - Jennifer Possley, Fairchild Tropical Botanic Garden.
Neste momento, uma em cada quatro espécies de plantas nativas estão criticamente ameaçadas de extinção regional ou já foram extirpadas devido à perda de habitat, coleta excessiva, ataque de espécies invasoras e outros fatores de degradação. Mais de 50 espécies desapareceram completamente.