Projeto de lei busca aumentar prazo decadencial em casos de violência doméstica
quinta-feira, 16 de maio de 2024, 13h51
O Projeto de Lei nº 1.713, de 2022, que busca alterar o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), prevê prazo maior para representação criminal em contexto de violência doméstica e tem pareceres favoráveis no Congresso Nacional.
Fruto das pesquisas de várias mulheres de diversas áreas de atuação, o PL 1.713, idealizado por estas subscritoras e minutado pela Comissão Nacional da Mulher Advogada Criminalista da Abracrim (Abracrim Mulher), encontra-se com parecer favorável na Comissão da Defesa dos Direitos da Mulher, na Câmara dos deputados.
Aprovado em decisão terminativa na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, o PL busca ampliar o prazo decadencial de seis para 12 meses para o exercício da “representação” e a propositura de “queixa-crime”, em casos de violência doméstica.
Tempo hábil
Considerando o ciclo de violência e toda a estrutura patriarcal existente na sociedade, a pretendida alteração legislativa é de suma relevância, pois permitirá que mulheres vítimas de violência doméstica tenham tempo hábil para buscar o apoio do sistema de justiça criminal sem atropelar seu próprio tempo.
Além disso, o projeto leva para a sociedade uma maior compreensão sobre a complexidade do ciclo de agressão sofrido pelas mulheres vítimas de violência doméstica, ciclo muitas vezes não compreendido, o que gera ainda mais sofrimento e preconceito, impondo às mulheres vítimas de violência ainda mais sofrimento e violência.
Acréscimo
A redação final aprovada no Senado Federal acresce o parágrafo único ao artigo 103 do Código Penal, passando a vigorar com a previsão de que para os crimes que se processam mediante representação criminal, no contexto de violência doméstica e familiar contra pessoa do gênero feminino, a ofendida decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 12 (doze) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime.
No que se refere às alterações previstas na Lei n° 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), temos o acréscimo do artigo 16 – A que de fato aumenta para 12 (doze) meses o prazo para o exercício do instituto da representação pela vítima em situação de violência doméstica e familiar.
Referidas propostas efetivarão alteração na Lei Processual, que passará a viger adequando-se à nova e necessária disposição legal.
Importante destacar emenda acolhida e incorporada ao relatório final da CCJ, que acrescenta o artigo 394-B ao Código de Processo Penal com a previsão da celeridade e prioridade na tramitação processual, e que também independerão, em todos os graus de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas, salvo em caso de má-fé.
A única discussão divergente no projeto é quanto à utilização dos termos “gênero feminino”, “sexo feminino”, “mulher”, porém, todos os pareceres até o momento são uníssonos quanto à necessidade da alteração da lei com a ampliação do prazo para representação criminal, permitindo, assim, que o sistema de Justiça resguarde direitos.
O projeto, que se encontra com um texto substitutivo devido às emendas apresentadas e incorporadas ao texto, após apreciação conclusiva nas comissões, vide artigo 24, II, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, retornará ao Senado Federal, onde a casa originária decidirá pela manutenção das alterações realizadas na Câmara dos deputados, ou pela manutenção do texto aprovado pela casa iniciadora.
Ciclo da violência
Vale mencionar que o maior estudo de referência no mundo para compreensão do impacto da violência doméstica na mulher, foi realizado pela psicóloga clínica e forense norte-americana Eleonor E. A. Walker (2017).
Eleonor identificou em pesquisa de campo realizada com cerca de 1.500 mulheres, um padrão de abuso da mulher, que a pesquisadora cunhou como “ciclo da violência doméstica”, para se referir à repetição da violência doméstica em que a mulher está inserida.
O resultado da pesquisa apontou os reflexos na vida e na saúde mental da mulher, além de descrever os mecanismos psíquicos que justificam a enorme dificuldade da mulher em sair destas situações.
Segundo a justificativa apresentada no texto original, a intervenção precoce e mais efetiva em níveis menores de violações pode interromper ou amenizar a evolução do ciclo da violência, vindo a prevenir crimes menores que se agravam e desaguam no feminicídio. Dilatar o prazo decadencial é intervir em fases anteriores da violência e precursoras do feminicídio.
Sobre a complexidade do ciclo da violência doméstica e a perda de prazos decadenciais pelas vítimas imersas em situação de violência doméstica, Izabella Borges tratou do tema nesta coluna em duas oportunidades, em janeiro de 2021, em texto escrito em coautoria com Bruna Borges, e em fevereiro do mesmo ano.
A minuta do projeto de lei foi elaborada por estas subscritoras, Izabella Borges – idealizadora da ideia – e Ana Paula Trento – presidente Nacional da Abracrim Mulher, além de Izadora Barbieri – diretora legislativa da Abracrim Mulher Nacional –, Layla Freitas – secretária-geral da Abracrim Mulher Nacional –, Simone Cabredo – diretora de assuntos Acadêmicos da Abracrim Mulher Nacinal – e pela psicanalista e psicóloga Forense Tamara Brockhausen.
Fonte: Consultor Jurídico