Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Centralidade da vítima e fundamentos jurídicos são temas de capacitação do MPRO sobre atuação com perspectiva de gênero

sexta-feira, 15 de agosto de 2025, 15h03

 

 

Com foco na centralidade da vítima e nos fundamentos jurídicos que orientam a atuação institucional com perspectiva de gênero, o Ministério Público de Rondônia (MPRO) realizou, nesta quinta-feira (14/8), em Porto Velho, capacitação interna voltada a membros, servidores e estagiários. A atividade abordou normativas e práticas para qualificar a atuação em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, com o objetivo de combater desigualdades estruturais que desafiam a promoção da justiça com efetividade e equidade.

 

O evento integrou o Projeto Agosto Lilás – Ciclo de Diálogos da Lei Maria da Penha 2025, sendo transmitido, a partir da Capital, para todas as comarcas no interior do estado. A iniciativa é executada pelo Núcleo de Atendimento às Vítimas (Navit), em parceria com a Escola Superior do MPRO (Empro).

 

Com o tema “Atuação do MP com perspectiva de Gênero”, a capacitação teve como ministrantes a Procuradora de Justiça do MP de Goiás Ivana Farina Navarrete Pena e as Promotoras de Justiça Patrícia Amorim Rego (do MP do Acre) e Cláudia Santos Garcia (MP do Espírito Santo), membra auxiliar da Corregedoria Nacional do Ministério Público.

 

 

A Procuradora Ivana Farina introduziu a ideia de atuação com perspectiva de gênero a partir de um resgate histórico de instrumentos normativos, tratados e pactuações internacionais, precedentes à Constituição Federal de 1988, que já previam a abordagem.

 

O inventário jurídico apresentado pela palestrante serviu para ilustrar o tempo histórico que o Estado brasileiro percorreu para absorver em seu aparato legal dispositivos que tratassem de uma atuação institucional voltada ao enfrentamento da violência de gênero.

 

Servindo-se da base do ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal, a Procuradora de Justiça chamou atenção para a demora do Estado em assegurar direitos que contribuem para a promoção ao combate à violência doméstica, originados no texto de 1988.

 

Em sua participação, Ivana Farina assinalou, por exemplo, dispositivos que tratam do direito constitucional à igualdade e à dignidade humana, assentados nos artigos 1º e 5º, abordando, ainda, o artigo 226, que impõe ao Estado o dever de assegurar a assistência à família, criando mecanismos para coibir a violência, no âmbito de suas relações.

 

A Procuradora reforçou a importância do papel de membros do MP na temática da atuação com perspectiva de gênero, citando o artigo 129 da Constituição, que trata do dever do MP em zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados por lei, promovendo as medidas necessárias à sua garantia.

 

“O MP foi concebido com todos os regramentos para ser vanguarda, para ir à frente, para defender os direitos sociais, o combate à desigualdade, à discriminação”, afirmou.

 

Centralidade da vítima

 

Em sua participação, a Promotora de Justiça do MP do Acre Patrícia Amorim fez uma exposição sobre o projeto desenvolvido pela instituição acreana, que vem sendo reconhecido como referência no atendimento à vítima de violência de gênero.

 

 

A Promotora de Justiça trouxe a Rondônia a experiência do MPAC com a instalação do Centro de Atendimento à Vítima (CAV), serviço implantado em 2016, com o objetivo de dar centralidade à vítima de violência de gênero, zelando pela promoção de seus direitos.

Patrícia Amorim explicou que o CAV atua prioritariamente no atendimento de vítimas de violência com motivação de gênero, como violência doméstica, violência obstétrica, crimes sexuais contra mulheres maiores de 18 anos e crimes contra pessoas LGBTQIAPN+, sem negligenciar o atendimento às demais vítimas em situação de vulnerabilidade.

 

Detalhando a metodologia do órgão, a palestrante afirmou comporem o protocolo de ação do serviço o acolhimento, a escuta ativa, a prestação de informações qualificadas e o combate à revitimização. “A vítima é um sujeito de direitos e isso precisa ser respeitado”, afirmou.

 

Discorrendo sobre fluxo de atendimento, a palestrante falou sobre a transversalidade das ações do centro, abordando o trabalho em rede e a interação do órgão com promotorias de Justiça.

 

Em sua abordagem, Patrícia Amorim ressaltou a importância da proteção integral e prevenção, afirmando que os elementos são fatores estruturantes para o combate às taxas de violência. “O feminicídio é um crime evitável. Estudos mostram que 90% das mulheres assassinadas não tinham medida protetiva. Nós, do Ministério Público, não podemos dormir sabendo que, a cada seis horas, uma mulher é vítima de feminicídio”, afirmou.

 

Gestão de Riscos

 

“Gestão de riscos em contextos de violência doméstica e familiar contra as mulheres” foi o tema da palestra da Promotora de Justiça do Espírito Santo (MPES) Cláudia Santos Garcia.

 

A palestrante chamou a atenção do público para a subnotificação observada no contexto de crimes dessa natureza, informando que 47,4% das vítimas não denunciam seus agressores ao serem alvo de violência - um padrão que, conforme frisou, vem se repetindo desde 2017. De acordo com pesquisas, mais 60% das vítimas são mulheres negras e periféricas.

 

 

“Esses dados indicam um padrão persistente de resistência ou limitação no acesso das mulheres aos canais oficiais de apoio institucionalizados, mesmo diante da gravidade da agressão sofrida. Esse fenômeno, como visto nas séries históricas, não é novo, e pode ser parcialmente atribuído ao estigma social que ainda envolve as vítimas de violência doméstica”, destacou.

 

Dimensionando o debate para uma atuação do MP com perspectiva de gênero, a Promotora de Justiça, membra auxiliar da Corregedoria Nacional do Ministério Público, discorreu sobre a Recomendação de Caráter Geral nº 03/2025, expedida pelo órgão, detalhando os dispositivos do instrumento a serem utilizados como orientadores pelas unidades do Ministério Público.

 

Cláudia Santos ressaltou que a recomendação preconiza, entre outras garantias, que seja assegurado o direito à informação da mulher vítima de violência; o respeito à mulher ao relatar o seu histórico de violências, sem julgamentos ou interrupções; que seja considerado o papel das desigualdades estruturais nos julgamentos de conflitos que envolvam mulheres; que sejam valorizadas as provas testemunhais, evitando exigências excessivas que inviabilizem a proteção e que seja reconhecida credibilidade da palavra da vítima, como meio legítimo de prova.

 

Cláudia Santos fez uma exposição de antecedentes históricos da recomendação da Corregedoria e, disseminando boas práticas, citou instrumentos orientadores para atuação com perspectiva de gênero. Em especial, mencionou o Formulário Nacional de Avaliação de Risco (FONAR), instituído pela Lei 14.149/2021, que identifica e avalia fatores de riscos em casos de violência de gênero.

 

“Esta é uma ferramenta valiosa, um instrumento objetivo que subsidia nossa atuação, para que possamos fazer o encaminhamento de cada vítima, de acordo comas necessidades dela”, disse.

 

Abertura

 

A capacitação desta quinta-feira foi aberta pelo Procurador-Geral de Justiça, Alexandre Jésus de Queiroz Santiago, que destacou a importância da visão gênero para uma atuação do MP mais efetiva. “Oportunidades como as de hoje são essenciais para revermos nossa atuação em casos individuais, em questões coletivas e até como cidadãos”, disse.

 

Sublinhando o elevado nível técnico da atividade, a Coordenadora do Navit, Promotora de Justiça Tânia Garcia, afirmou que a atividade serve para impulsionar o compartilhamento de conhecimentos e aprimorar a promoção da justiça. “Vejo com muita esperança o interesse dos integrantes do MP de Rondônia nessa pauta, e estou confiante de que estamos construindo novos padrões para a atuação institucional com perspectiva de gênero”, afirmou.

 

Em sentido similar, a Diretora da Empro, Promotora de Justiça Edna Capelli, reiterou a relevância da capacitação. “No MPRO, o Agosto Lilás tem sido intenso, o que demonstra nosso compromisso com o tema e com a sociedade”.

 

A atividade de abertura contou, ainda, com a presença do Subprocurador-Geral de Justiça Administrativo, Marcelo Lima de Oliveira, e da Coordenadora de Planejamento (Coplan), Promotora de Justiça Tâmera Padoin Marques Marin.

 

Fonte: MPRO


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