Jurisprudência TJMG - Curatela. Estatuto da pessoa com deficiência. Limites da curatela
sexta-feira, 14 de outubro de 2022, 13h00
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CURATELA - ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (LEI Nº 13.146/2015) - INCAPACIDADE RELATIVA - LIMITES DA CURATELA - NECESSIDADE DO CURATELADO E CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO - ATRIBUIÇÃO DOS PODERES DE REPRESENTAÇÃO AO CURADOR - POSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que modificou a redação dos arts. 3º e 4º do CCB, pessoas com deficiência mental ou intelectual deixaram de ser consideradas absolutamente incapazes, sendo relativamente incapazes a certos atos ou à maneira de exercê-los. 2. Nos termos do art. 84, § 3º, da Lei nº 13.146/2015 e art. 755, I e II, do CPC, a curatela, além de ser medida excepcional, seus limites devem ser fixados de maneira proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, observado o estado e o desenvolvimento mental do curatelado. 3. Considerando que a finalidade da curatela é a proteção dos interesses do curatelado, para as hipóteses em que o estado patológico conduz à falta de discernimento, total e permanente, inviabilizando a tomada de decisões autônomas ou mediante auxílio, a concessão dos poderes de representação ao curador nomeado, quanto aos atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, revela-se medida mais adequada ao caso sub examine. 4. Sentença mantida. 5. Recurso não provido.(TJMG - AC: 10000205992183001 MG, Relator: Raimundo Messias Júnior, Data de Julgamento: 25/01/2022, Câmaras Cíveis / 2ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 26/01/2022).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CURATELA - ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (LEI Nº 13.146/2015) - INCAPACIDADE RELATIVA - LIMITES DA CURATELA - NECESSIDADE DO CURATELADO E CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO - ATRIBUIÇÃO DOS PODERES DE REPRESENTAÇÃO AO CURADOR - POSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que modificou a redação dos arts. 3º e 4º do CCB, pessoas com deficiência mental ou intelectual deixaram de ser consideradas absolutamente incapazes, sendo relativamente incapazes a certos atos ou à maneira de exercê-los. 2. Nos termos do art. 84, § 3º, da Lei nº 13.146/2015 e art. 755, I e II, do CPC, a curatela, além de ser medida excepcional, seus limites devem ser fixados de maneira proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, observado o estado e o desenvolvimento mental do curatelado. 3. Considerando que a finalidade da curatela é a proteção dos interesses do curatelado, para as hipóteses em que o estado patológico conduz à falta de discernimento, total e permanente, inviabilizando a tomada de decisões autônomas ou mediante auxílio, a concessão dos poderes de representação ao curador nomeado, quanto aos atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, revela-se medida mais adequada ao caso sub examine. 4. Sentença mantida. 5. Recurso não provido.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.20.599218-3/001 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE (S):
P/CURADOR (A) ESPECIAL DEFENSORIA PÚBLICA
APELADO (A)(S):
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR
RELATOR
O SR. DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR (RELATOR)
V O T O
Trata-se de apelação da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Uberlândia (ordem 66), que nos autos da presente Ação de Curatela de (...), julgou procedentes os pedidos, para reconhecer a incapacidade relativa da curatelada, para os atos negociais, patrimoniais e de administração, nomeando o autor como curador, com poderes de representação, determinando a obrigação deste em prestar contas anualmente, na forma contábil.
Em suas razões (ordem 82), sustenta o Dr. Alexander Cintra da Silva Souza, Defensor Público, nomeado curador Especial, nos termos do art. 752, § 2º do CPC(ordem 30), que o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) estabeleceu a incapacidade relativa dos enfermos mentais, de modo que o curador deve assistir ao curatelado e não representá-lo. Assevera que um dos objetivos da referida lei é proporcionar a inclusão social das pessoas com deficiência, não sendo cabível a interpretação extensiva da norma. Requer o provimento do recurso para que sejam atribuídos, ao autor/curador os poderes da assistência e não da representação.
Contrarrazões à ordem 85.
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (ordem 88).
É o relatório.
Conheço do recurso, uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade.
Cinge-se a controvérsia a aferir se há elementos nos autos para atribuir ao curador os poderes de representação, e não de assistência à curatelada, em relação aos atos negociais, patrimoniais e de administração dos bens.
Em primeiro plano, verifica-se que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) nº 13.146/2015, trouxe novos contornos ao instituto da curatela e alterou, substancialmente, os arts. 3º e 4º do Código Civil, que possuem a seguinte redação:
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
IV - os pródigos.
Diante disso, a incapacidade absoluta restringe-se aos menores de 16 anos, sendo relativamente incapazes aqueles que possuem limitações para exprimir sua vontade, independente da doença ter caráter permanente ou não, e da extensão da limitação.
Nesse cenário, os arts. 84 e 85, da Lei nº 13.146/2015 estabeleceram o direito da pessoa com deficiência de exercer sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas, com o objetivo de proporcionar a inclusão social, e determinaram que a curatela, além de ser medida excepcional, deve ser fixada de maneira proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, in verbis:
Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1º Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei.
§ 2º É facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de tomada de decisão apoiada.
§ 3º A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível.
§ 4º Os curadores são obrigados a prestar, anualmente, contas de sua administração ao juiz, apresentando o balanço do respectivo ano.
Art. 85. A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial.
§ 1º A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.
§ 2º A curatela constitui medida extraordinária, devendo constar da sentença as razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado.
§ 3º No caso de pessoa em situação de institucionalização, ao nomear curador, o juiz deve dar preferência a pessoa que tenha vínculo de natureza familiar, afetiva ou comunitária com o curatelado. (grifei)
No mesmo sentido destaca-se a norma do art. 755 do CPC:
Art. 755. Na sentença que decretar a interdição, o juiz:
I - nomeará curador, que poderá ser o requerente da interdição, e fixará os limites da curatela, segundo o estado e o desenvolvimento mental do interdito;
II - considerará as características pessoais do interdito, observando suas potencialidades, habilidades, vontades e preferências.
§ 1º A curatela deve ser atribuída a quem melhor possa atender aos interesses do curatelado.
(...)
No caso concreto, verifica-se que a curatelada é mãe do autor, possui 84 anos e quadro de "Demência Senil CID F02", por sequela neurológica grave devido ao AVC isquêmico, conforme consta do laudo médico de ordens 09 e 51.
Na inspeção realizada pelo Juízo, na instituição onde a curatelada reside, restou constatada a grande dificuldade deste para compreender e responder às perguntas formuladas (ordem 29).
Realizada a perícia médica (ordem 51), o Dr. (...), informou que a paciente "encontra-se com déficit neurológico intenso e retida no leito", e que há impedimento em longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial para a participação plena e efetiva na sociedade. Conclui que a paciente "não apresenta condições de exercer atos da vida civil bem como depende de terceiros para realizar suas atividades".
Nesse contexto, considerando que a finalidade da curatela é a proteção dos interesses do curatelado, para as hipóteses em que o estado patológico conduz a falta de discernimento, total e permanente, inviabilizando a tomada de decisões autônomas ou mediante auxílio, embora a nova legislação a atribua a incapacidade relativa, a determinação dos poderes de representação ao curador nomeado revela-se medida mais adequada às necessidades da curatelada.
Sim, pois, em regra, na assistência curador e curatelado praticam o ato ou a tomada de decisão em conjunto, sendo que ambos manifestam a vontade, o que não se mostra adequada à situação dos autos, considerando a condição de saúde física e mental da curatelada, razão pela qual a sentença não merece reparo.
A propósito a jurisprudência deste e. Tribunal, em casos semelhantes:
APELAÇÃO CÍVEL - INTERDIÇÃO - INCAPACIDADE ABSOLUTA PARA A PRÁTICA DOS ATOS DA VIDA CIVIL - ALTERAÇÃO LEGISLATIVA - EFEITOS DA CURATELA - CASO CONCRETO - POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO - ALVARÁ JUDICIAL - ÔNUS DESNECESSÁRIO.
- A teor do art. 1.767 do Código Civil, estão sujeitos a curatela aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil.
- A Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) alterou dispositivos do Código Civil e restringiu o rol dos absolutamente incapazes aos menores de 16 (dezesseis) anos, passando as pessoas que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade, a figurar como relativamente incapazes (art. 4º, III, CC).
- Dispõe o art. 755 do NCPC que, ao proferir a sentença que decreta a interdição, o juiz fixará os limites da curatela, segundo o estado e o desenvolvimento mental do interdito, considerando as características pessoais do interdito, suas potencialidades, habilidades, vontades e preferências, não havendo, portanto, vedação legal para a concessão dos poderes de representação em conformidade com as peculiaridades do caso concreto.
- Impor ao curador o ônus de recorrer ao judiciário para requerer alvará judicial sempre que precisar praticar algum ato em nome da curatelada não se revela a medida mais eficaz e não coaduna com o objeto da curatela, que é justamente viabilizar ao doente o exercício de seus direitos, por meio de interposta pessoa, sobretudo quando não tem qualquer discernimento para os atos da vida civil. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.20.483426-1/001, Relator (a): Des.(a) Alexandre Santiago, 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/09/0020, publicação da sumula em 11/09/2020 - grifei).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INTERDIÇÃO - NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL PARA A PRÁTICA DE ALGUNS ATOS DA VIDA CIVIL - DEFICIENTE MENTAL - LAUDO MÉDICO PERICIAL - INCAPACIDADE RELATIVA DECLARADA - PODER DE REPRESENTAÇÃO - POSSIBILIDADE. I - Conquanto o procedimento da interdição não esteja previsto na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência - Lei nº. 13.146/2015), que alterou as disposições do CCB/2002 relativas à curatela, o instituto possui previsão expressa no vigente CPC/15, podendo ser decretada segundo o estado e o desenvolvimento mental do interdito e nos limites da capacidade verificada na instrução do feito. II - Constatado, por meio de laudos médicos produzidos nos autos, que o curatelando é relativamente incapaz para a prática de atos de disposição patrimonial, impositiva a nomeação de curador especial e a fixação dos limites do encargo observando suas potencialidades, habilidades, vontades e preferências, não se tratando de medida invasiva ou prejudicial a sua liberdade se poderá praticar todos os demais atos de vida civil como bem entender. III - Na esteira do entendimento jurisprudencial, é cabível a atribuição de poderes de representação ao curador, a fim de se garantir maior proteção ao curatelado, mormente em face da constatada situação de vulnerabilidade. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.20.466800-8/001, Relator (a): Des.(a) Peixoto Henriques, 7ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 06/10/0020, publicação da sumula em 14/10/2020 - grifei).
Com essas considerações, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.
Custas recursais pela apelante, observando-se a gratuidade judiciária.
DESA. MARIA INÊS SOUZA - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. CAETANO LEVI LOPES - De acordo com o (a) Relator (a).
SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."