gestão urbana
Seminário Nacional de Urbanismo debate ATHIS e regularização fundiária
por CAU/BR
terça-feira, 17 de novembro de 2020, 06h33
Foram apresentados números impressionantes sobre a realidade urbana brasileira e como os arquitetos e urbanistas brasileiros podem atuar na transformação

Desafios da autoconstrução urbana, propostas de reurbanização, melhorias habitacionais e regularização fundiária fizeram parte dos debates propostos pelo I Seminário Nacional de Urbanismo, promovido pela Comissão de Política Profissional do CAU/BR, no dia 10 de novembro. Foram apresentados números impressionantes sobre a realidade urbana brasileira, e como os arquitetos e urbanistas brasileiros podem atuar na transformação da qualidade de vida no país. Pesquisa da Fapesp mostra que 84% da população está concentrada em 0,6% do território que corresponde à mancha urbana. Em São Paulo, 30% da população vive em 1.100 assentamentos precários.
“Por uma série de motivos, a nossa população é eminentemente urbana. Com a população concentrada nas cidades, 85% das pessoas fazem construções e reformas sem assistência técnica de arquitetos e engenheiros, como mostrou uma pesquisa do CAU/BR”, comentou o suplente de conselheiro federal Eduardo Fajardo (MG). “Isso se reflete em doenças e acidentes”. Para o conselheiro do CAU/SP André Blanco, o Seminário Nacional de Urbanismo é pensar uma cidade mais justa e igualitária. “A pandemia nos mostrou quantos problemas temos a enfrentar”, disse.
A arquiteta e urbanista Maria Teresa Diniz, que coordenou o Programa de Urbanização de Paraisópolis, da Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo, afirma que o primeiro passo é planejamento, conhecer a demanda e integrar as ferramentas de gestão. “É preciso prestar atenção nas ferramentas de gestão e monitoramento, gerando uma melhoria contínua nas nossas cidades”, disse. “Não existem novidades, a gente já sabe o que tem que fazer, mas parece que estamos sempre recomeçando a mesma discussão”.
EXPERIÊNCIA EM PARASÓPOLIS (SP)
Maria Tereza conta que a habitação é uma prioridade para a população de Paraisópolis, maior favela de São Paulo. Segundo pesquisa feita pela prefeitura entre os moradores, 73% das famílias querem fazer reformas em casa. Mais de um terço (34%) diz que o último gasto familiar relevante foi justamente com obras de reformas. Essas obras teriam como objetivo a valorização do imóvel (para 34% dos entrevistados) e a saúde da família (25% dos entrevistados).
No caso da urbanização de áreas precárias, a palestrante disse que é preciso abrir novas ruas, novas janelas e portas, criando novas frentes urbanas. “É importante envolver a população na criação de áreas públicas, inclusive com artistas locais. A melhoria das fachadas passa por uma questão logística, às vezes é impossível colocar um andaime na rua”, disse, relatando experiências com obras feitas em Paraisópolis.
A arquiteta e urbanista apresentou o Plano Municipal de Habitação de São Paulo e publicações como “Do Plano ao Projeto: novos bairros e habitação social em São Paulo” e “Diretrizes de Projeto 2008-2012” – esta última com uma planilha de escopo de projetos, para facilitar a contratação pelo poder público. Para ela, não adianta sonhar com as possibilidades que o plano diretor oferece sem ter as fontes de financiamento. “Financiamento é muito importante. Nós arquitetos precisamos nos aproximar mais desse assunto para alcançar os objetivos que queremos tanto”, disse.
PROTAGONISMO DOS ARQUITETOS E URBANISTAS
Na área de Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social, o Seminário Nacional de Urbanismo apresentou ainda a experiência da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB). Enquanto foi presidente da CODHAB-DF, o arquiteto e urbanista Gilson Paranhos implementou dez postos de assistência técnica nas comunidades periféricas de Brasília. Para ele, a mudança deve começar com ações de arquitetos e urbanistas.
“Nós arquitetos é que temos que assumir essa parada, puxar esse barco. Quem entende de cidades somos nós”, disse. “Nós temos que ter junto conosco, advogado, agente de meio ambiente, o assistente social, mas o arquiteto tem que liderar isso, pela nossa formação, que não é restrita, especialização”. Ele destaca que, para isso, a equipe de arquitetos tem que estar no local. “A população precisa entender o que estamos fazendo. Precisamos de uma comunicação com a faixa de renda mais necessitada.”
Gilson conta regularização de imóveis também é atribuição de arquitetos e urbanistas. “Só fui entender isso depois de muitos anos de carreira, nunca pensei que eu era o principal responsável por entregar esse documento e mudar a condição de vida de uma família”, conta. “Infelizmente, os gestores têm medo de assinar regularização fundiária, por causa da quantidade absurda de leis. A população tem que saber disso”.
Recentemente, Gilson Paranhos recebeu da Federação Pan-Americana de Associações de Arquitetos o Prêmio FPAA 2020, na categoria Arquiteto em Função Pública. Sua trajetória profissional foi sempre marcada por uma importante participação nas entidades de classe, com destaque para a sua atuação no Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e na CODHAB-DF.⠀
REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NA AMAZÔNIA
Para a arquiteta Myrian Cardoso, professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), a regularização deve ser vista como instrumento de gestão urbana. “Muito mais que entregar o título, é fazer a regularização administrativa do processo, reconhecendo os bairros e os logradouros. A partir daí, o município pode buscar mais recursos para a urbanização”, disse. “Como são assentamentos em áreas ilegais, isso dificulta o acesso a financiamentos e obras governamentais.”
Myrian apresentou o Projeto Moradia Cidadã da UFPA, que promoveu a regularização fundiária em seis municípios do noroeste paraense, auxiliando as prefeituras em áreas cedidas pelo governo federal. Em 2009, o governo doou 412 áreas para 138 municípios da Amazônia. “São estudos para construir novos caminhos para destravar a regularização fundiária na Amazônia, uma vez que a legislação federal não da conta das especificidades locais.”
O projeto envolve uma leitura político-administrativa do território, uma leitura urbanístico-ambiental, uma leitura dos diferentes estágios de consolidação urbana e uma leitura institucional-municipal. Hoje, o projeto está se estendendo aos nove estados da Amazônia Legal, por meio de uma parceria entre as universidades federais.
“As universidades apoiam os governos municipais e estaduais com estudos técnicos, diálogo com a comunidade e definição de parâmetros urbanísticos”, conta ela. Ela destacou ainda a importância de sensibilizar profissionais e alunos do lugar de fala do arquiteto e urbanista nesse processo. “Na temática fundiária, o arquiteto ainda está muito distante.”
Fonte: CAU/BR