Casal que teve criança afastada do convívio familiar pode entrar com novo pedido de guarda
terça-feira, 27 de outubro de 2020, 10h54
Sentença que afastou criança do lar não impede pedido judicial de guarda pela mesma família. A orientação tem amparo na necessidade de observar o melhor interesse da criança, sua proteção integral e prioritária, além da possibilidade de revisão da situação de guarda a qualquer tempo.
O entendimento foi adotado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP. A decisão inicial, em razão de suposta coisa julgada na ação de acolhimento institucional, indeferiu a ação de guarda ajuizada pelo mesmo casal que havia perdido a tutela da criança.
Com o caso, fixou-se que ??mesmo após o trânsito em julgado da sentença que determinou o afastamento de uma criança do convívio familiar e sua colocação em abrigo, as pessoas que anteriormente exerciam a guarda e pretendem formalizar a adoção têm interesse jurídico para, após considerável transcurso de tempo, ajuizar ação de guard?a fundamentada na modificação das circunstâncias que justificaram o acolhimento institucional.
Após quatro anos, circunstâncias são outras
O casal buscou reaver a guarda que exerceu irregularmente entre 2014 e 2016, quando houve burla ao cadastro de adoção, a afirmação falsa de infertilidade e falsidade em registro civil. Em 2018, eles ingressaram com ação de guarda, indeferida pelo juiz, que extinguiu o processo sem resolução de mérito.
O magistrado afirmou que todas as questões apontadas pelos autores já teriam sido analisadas na ação anterior de afastamento. A decisão foi mantida pelo TJSP. No recurso ao STJ, o casal alegou que as circunstâncias agora seriam outras: a criança, agora aos 6 anos, já está há 4 em abrigo, dificultando a adoção por terceiros, além de ter vínculos socioafetivos com a família.
Não se deve “romantizar uma ilegalidade”, segundo ministra
“De fato, conquanto se verifique, em um determinado momento histórico, que certas pessoas possuíam a aptidão para o regular e adequado exercício da guarda de um menor, é absolutamente factível que, em outro e futuro momento histórico, não mais subsistam as razões que sustentaram a conclusão de outrora”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, na análise do caso.
A magistrada enfatizou que não se trata de concordar com a transgressão ao cadastro de adotantes, nem de “romantizar uma ilegalidade”. Ao contrário, é preciso reafirmar que, “nas ações que envolvem a filiação e a situação de menores, é imprescindível que haja o profundo, pormenorizado e casuístico exame dos fatos da causa, pois, quando se julgam as pessoas, e não os fatos, normalmente há um prejudicial distanciamento daquele que deve ser o maior foco de todas as atenções: a criança”.
A relatora esclareceu que a aplicação das medidas protetivas e de acolhimento devem, sempre, ser examinadas à luz do princípio da proteção prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Acrescentou como fundamental ouvir e garantir a efetiva participação de todos os envolvidos, com base na mesma legislação, além de realizar os estudos psicossociais e interdisciplinares necessários.
Ao dar provimento ao recurso e determinar o prosseguimento da ação de guarda, a ministra ressaltou: “É preciso que haja uma imediata correção de rumo, especialmente porque se trata de criança que atualmente conta com mais de seis anos e que se encontra acolhida há mais de quatro anos sem nenhuma perspectiva concreta de sair do albergamento”. O número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Fonte: IBDFAM