Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

STJ confirma validade de adoção póstuma por adotante com capacidade civil contestada

por Débora Anunciação

sexta-feira, 16 de maio de 2025, 16h31

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça  – STJ validou a adoção póstuma de uma criança, mesmo diante de questionamentos da família a respeito da capacidade civil do adotante falecido. O colegiado entendeu pela validação do vínculo em nome do melhor interesse da criança.

O caso envolve uma ação de destituição do poder familiar da mãe biológica, cumulada com pedido de adoção.

O TJMG havia reconhecido que a adoção poderia ser concretizada mesmo após o falecimento de um dos adotantes, considerando que a genitora entregou o recém-nascido diretamente aos pretendentes à adoção. O Tribunal também considerou a declaração expressa do adotante falecido, feita em vida, demonstrando o desejo de adotar em conjunto com sua companheira.

Com base neste entendimento, o TJMG reconheceu a validade dessa manifestação e deferiu a adoção em favor da companheira sobrevivente, com base nos laços de afeto consolidados e no melhor interesse da criança. A existência da união estável, no entanto, foi questionada, e o Tribunal estadual entendeu que a eventual paternidade socioafetiva do falecido deveria ser discutida em ação autônoma.

Recursos foram interpostos por três familiares do adotante falecido. Um deles alegou dúvida fundada quanto à capacidade mental do falecido na época da concessão da guarda provisória e defendeu a necessidade de nomeação de curador especial. Também pediu a reabertura da instrução probatória para esclarecimento da questão.

Outro familiar sustentou que o direito à adoção é personalíssimo e se extingue com a morte, além de criticar a desconsideração de laudos psicológicos que indicariam incapacidade do adotante.

Já o terceiro familiar questionou a inexistência de reconhecimento judicial da união estável e acusou burla ao Cadastro Nacional de Adoção, pois os pretendentes foram habilitados apenas após já exercerem a guarda de fato da criança – o que, segundo ele, comprometeria os princípios da impessoalidade e do melhor interesse.

Ao avaliar o caso, o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, afirmou que a ausência de interdição judicial ou de provas robustas de incapacidade garantem a presunção da capacidade civil do adotante.

O relator também reconheceu a possibilidade de união estável com base em declaração conjunta dos adotantes e provas de estabilidade familiar, sendo possível seu reconhecimento incidental na própria ação de adoção. Quanto à adoção póstuma, invocou o § 6º do art. 42 do ECA, que autoriza a medida quando há manifestação de vontade inequívoca do falecido.

Sobre a ausência de inscrição no Cadastro Nacional de Adoção, ressaltou que o princípio do melhor interesse da criança pode justificar exceções. "A adoção por meio do Cadastro Nacional de Adoção e a observância de sua ordem deve ser excepcionada em raríssimas hipóteses, apenas quando demonstrado atendimento ao melhor interesse da criança".

Superior interesse

Para a presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Silvana do Monte Moreira, decisões como essa reforçam o lugar ocupado pelo único sujeito de direitos cujo superior interesse deve ser atendido por todos: as crianças e os adolescentes.

A diretora nacional do IBDFAM afirma que trata-se do reconhecimento dos laços socioafetivos como efetivos para a constituição da entidade familiar. “Questões como união estável e adoção póstuma são baseadas em provas. Tentar desqualificar o desejo através de alegações capacitistas não têm mais lugar na sociedade atual.”

“O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, verificou as questões de provas trazidas ao processo, ou melhor, a ausência delas, já que não há qualquer pedido de curatela ou decisão assistida para o adotante/companheiro falecido, igualmente não foram produzidas provas da alegada incapacidade do adotante/companheiro que declarou desejar adotar com a companheira aquela criança específica”, observa.

Ela complementa: “Quanto à questão da quebra da fila do sistema nacional de adoção e acolhimento SNA, parece-me uma tentativa desesperada de desconstruir uma parentalidade já existente. O SNA não é engessador e inúmeras decisões corroboram essa tese, notadamente quando há uma relação socioafetiva comprovada e o atendimento do superior interesse da criança”.

A decisão, segundo a especialista, solidifica o afeto, o cuidado, o amor e o próprio desejo, já que todos nós somos seres desejantes, como o verdadeiro DNA formador das famílias. “O sangue, meramente, não constitui verdadeiras famílias.”

“O relator também reconheceu a possibilidade de união estável com base em declaração conjunta dos adotantes e provas de estabilidade familiar, sendo possível seu reconhecimento incidental na própria ação de adoção. Quanto à adoção póstuma, invocou o § 6º do art. 42 do ECA, que autoriza a medida quando há manifestação de vontade inequívoca do falecido”, lembra.

Sobre a ausência de inscrição no Cadastro Nacional de Adoção, acrescenta Silvana, a decisão ressaltou que o princípio do melhor interesse da criança pode justificar exceções. "A adoção por meio do CNA e a observância de sua ordem deve ser excepcionada em raríssimas hipóteses, apenas quando demonstrado atendimento ao melhor interesse da criança".


Fonte: IBDFAM


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