Novo entendimento do STJ pode dificultar o processo de Recuperação Judicial das empresas
por Charles Nasrallah
quarta-feira, 01 de novembro de 2023, 14h16
Decisão recente da terceira turma do STJ abre precedentes para a exigência de uma Certidão Negativa de Débitos Fiscais às empresas que requererem a recuperação
O Superior Tribunal de Justiça mudou o seu entendimento e passou a decidir pela exigência de Certidão Negativa de Débitos Fiscais para a homologação de plano de Recuperação Judicial. Antes da alteração, a ausência de sujeição dos créditos fiscais era levada em consideração pelos Tribunais aos efeitos da Recuperação, pois entendiam que a exigência fugia do objetivo de reedificar uma empresa.
Até então, o débito fiscal não era sujeito à Recuperação Judicial, sendo assim, o Fisco não estava submisso às regras de proteção conferidas à empresa recuperanda com relação aos demais credores. Não sofrendo, portanto, a novação prevista no artigo 59 da Lei 11.101/2005 e, a partir da promulgação da Lei 14.112/2020 e não se sujeitando ao crivo do juízo da recuperação para processar as execuções e nem o seu controle, limitando-se, este, em substituir eventuais bens essenciais que sofram constrições pelos juízos fiscais.
Para o especialista em Recuperação Judicial e sócio do NCSS advogados Charles Nasrallah, esse era o entendimento mais adequado para a questão. “Uma vez que o Fisco, não querendo se sujeitar aos efeitos da Recuperação, foi mantido de fora deste instituto, podendo, inclusive, prosseguir com execuções fiscais pelos valores globais e atualizados de seus créditos, não se demonstra razoável exigir que, para uma empresa já em dificuldades financeiras, tais débitos estejam efetivamente confessados e em pagamento”, afirma.
O julgamento pela Terceira Turma, do Recurso Especial de nº 2053240 – SP, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze entendeu que, após a edição da Lei nº 14.112/2020, que alterou a Lei 11.101/2005, a Lei de Recuperações e Falências, a empresa em Recuperação teve acesso a parcelamentos e transações fiscais específicas, com a finalidade de facilitar a regularização fiscal para estas empresas.
No julgamento do Recurso Especial em comento, a D. Terceira Turma decidiu que, uma vez que possibilitada à empresa recuperanda a adesão de planos de parcelamento e transação, supostamente mais benéficas do que a persecução do crédito fiscal, é necessário que o juízo da recuperação exija que a empresa, ao realizar o pedido de soerguimento, acrescente a um plano de pagamento que trate, de forma global, o passivo fiscal, instituindo: “A exigência da regularidade fiscal, como condição à concessão da recuperação judicial, longe de encerrar um método coercitivo espúrio de cumprimento das obrigações, constituiu a forma encontrada pela lei para, em atenção aos parâmetros de razoabilidade, equilibrar os relevantes fins do processo recuperacional, em toda a sua dimensão econômica e social, de um lado, e o interesse público titularizado pela Fazenda Pública, de outro. Justamente porque a concessão da recuperação judicial sinaliza o almejado saneamento, como um todo, de seus débitos, a exigência de regularidade fiscal da empresa constitui pressuposto da decisão judicial que assim a declare”.
Segundo Charles Nasrallah, esse entendimento impõe às empresas uma desvantagem ao se comparar ao Fisco, sobretudo às empresas em dificuldades financeiras, tornando inviável o processo de Recuperação Judicial. “Com o novo entendimento do STJ, verificamos que as empresas ficam ainda mais limitadas ao tentar buscar o soerguimento e sujeitas ao peso desigual e injusto dos créditos fiscais, que não detém nenhum ônus dos efeitos da Recuperação Judicial, e, agora, possuem o poder de inviabilizar a homologação deste procedimento, caso seus créditos não estejam confessados e estejam em pagamento.”
Na visão do especialista, a empresa que se encontra a ponto de insolvência e tem a necessidade de se socorrer do judiciário para não lhe ser decretada a falência, não conseguirá, com esse novo entendimento, arcar com débitos fiscais em momento anterior a este pedido. Da mesma forma que a adesão à um eventual parcelamento pressupõe, na grande maioria das vezes, na confissão dos débitos cobrados, o que retira a possibilidade da empresa em requerer, por exemplo, o reconhecimento de prescrições, decadências e outros institutos a seu favor com vistas a reduzir ou eliminar parte dos débitos declarados pelo Fisco.
Fonte: Jornal Jurid