Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

PGR reforça inconstitucionalidade de dispositivo da Lei do Planejamento Familiar que restringe esterilização voluntária

quarta-feira, 16 de novembro de 2022, 12h56

Apesar da alteração no texto da lei, Augusto Aras afirma que limitação de idade e de quantidade de filhos para realização do procedimento fere Constituição

Em parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, reforça a inconstitucionalidade de trechos da Lei do Planejamento Familiar (Lei n. 9.263/1996) que impõem restrições à esterilização de homens e mulheres, mesmo após as recentes mudanças na legislação. O texto atual – modificado pela Lei 14.443/2022 – estabelece que apenas homens e mulheres maiores de 21 anos ou com pelo menos dois filhos vivos podem fazer o procedimento. Segundo o PGR, as restrições relacionadas à faixa etária e à quantidade de filhos ofendem a liberdade individual e constituem indevida interferência estatal na autonomia privada do cidadão.

O posicionamento do PGR foi na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.911, ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que questiona as restrições impostas à esterilização de homens e mulheres. A princípio, a ação também contestava trecho da Lei do Planejamento Familiar que exigia o consentimento do cônjuge para a realização do procedimento (§ 5º, inciso II, artigo 10). No entanto, o dispositivo acabou sendo revogado pela Lei 14.443/2022, que também alterou de 25 para 21 anos a idade mínima para realizar esterilização (inciso I do artigo 10).

Apesar das mudanças, o PGR sustenta que o texto permanece inconstitucional pois não houve alteração substancial da norma, uma vez que apenas se reduziu a idade mínima, sem modificar a exigência alternativa de que se tenham dois filhos vivos. Augusto Aras reforça que o controle da própria fecundidade, pelo método que pareça mais eficaz para cada indivíduo, desde que lícito, integra o rol de direitos consolidados no princípio constitucional da dignidade humana. “A dignidade da pessoa vincula-se à potencialidade de autodeterminar-se livremente, inclusive quanto ao exercício de direitos reprodutivos”, afirma no parecer.

Para o procurador-geral da República, a lei representa interferência estatal na livre decisão de ter ou não ter filhos, impondo-se restrições para resguardar a possibilidade de eventualmente tê-los no futuro. Mesmo que a previsão legal não resulte, evidentemente, na obrigação de ter filhos, Aras destaca que a norma deslegitima a opção de uma pessoa plenamente capaz não querer gerar descendentes. Na avaliação dele, essa decisão é tão válida quanto a de querer filhos, por isso não pode sofrer limitação imposta por lei.

Limitações - Ao impor a idade mínima de 21 anos, segundo Aras, a lei destoa do restante do ordenamento jurídico, uma vez que a restrição etária é incompatível com a previsão da maioridade civil e penal aos 18 anos de idade. Como exemplo, ele cita que pessoas a partir desta idade já possuem permissão legal, independentemente do estado civil, para adotar uma criança. Por outro lado, o ordenamento jurídico não concede a essa mesma pessoa a autonomia para deliberar sobre seu direito reprodutivo, assunto que não interessa a ninguém mais além do próprio sujeito.

O PGR também considera inconstitucional o trecho que impõem quantidade mínima de filhos vivos para que menores de 21 anos realizem o procedimento. Ao estabelecer esse parâmetro, segundo ele, a lei sugere a quantidade de descendentes que seria social e pessoalmente ideal antes de submeter-se à operação, interferindo de forma indevida na autonomia privada dos cidadãos.

Íntegra do Parecer na ADI 5.911/DF


Fonte: MPF


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