Jurisprudência TJDFT - Academia. Discriminação com criança autista. Falha na prestação do serviço. Dano material e moral configurados. Quantum mantido
segunda-feira, 10 de outubro de 2022, 13h36
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONSUMIDOR. ACADEMIA. DISCRIMINAÇÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS. QUANTUM MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Insurge-se o réu contra a sentença do juízo a quo que o condenou a restituir o valor de R$ 671,30 (seiscentos e setenta e um reais e trinta centavos) e a pagar a quantia de 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais à autora. Alega que não praticou ato ilícito, agindo de acordo com os protocolos de segurança em razão da pandemia do coronavírus. Assevera que não houve discriminação de seus funcionários em relação a filha da autora. 2. Recurso próprio e tempestivo (Id. 38866661). Preparo regular (Id. 38866662 a Id. 38866665). Contrarrazões apresentadas (Id. 38866670). 3. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, haja vista estarem inseridasnos conceitos de fornecedor e consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor. 4. No caso, a autora firmou contrato de prestação com a academia ré e no dia 14/9/2021 compareceu aoestabelecimento para fazer aula de fitdance, acompanhada de sua filha de 10 anos de idade, que é autista. Afirma que pouco antes do início da aula foi informada pelo coordenador da unidade que sua filha não poderia permanecer dentro da sala. Alega discriminação por sua filha ser autista, uma vez que a academia permite a entrada de outras crianças na sala de dança. O réu por sua vez, afirma que tão somente cumpriu o decreto do governador de limitação de usuários no mesmo espaço, com fim de conter os avanços da pandemia do coronavírus. Que agiu com discrição e que não houve qualquer tipo de discriminação. 5. A prova testemunhal corroborou com os argumentos da inicial. Conforme se verifica pelo relato dacliente Ana Paula, o coordenador da unidade não permitiu que a filha da autora ficasse na sala com o único argumento de que não era permitida a entrada de crianças naquele ambiente. Todavia, ressalta que a academia permite a permanência de outras crianças na sala, tanto antes como depois do ocorrido (Id. 38866642). O professor de dança também afirmou que era comum crianças no local, que essa situação nunca foi empecilho para a realização da aula e que a filha da autora nunca deu nenhum trabalho ou causou qualquer dificuldade. Disse que outras crianças também foram autorizadas a permanecer na sala em outras oportunidades. Ainda respondeu que o coordenador não queria a permanência da filha da autora no local por que ela tinha atitudes “erradas” (Id. 38866644). Ademais, não prospera a alegação da ré de que solicitou que a criança ficasse em local apropriado, uma vez que a cliente Ana Paula disse que na academia não tem espaço reservado para crianças. 6. Conforme as regras consumeristas, o fornecedor de serviços responde, independentemente daexistência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (art. 14). O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou se provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, § 3.º). 7. Logo, comprovada falha na prestação do serviço gera o dever de indenizar em razão do ato do prepostoda requerida extrapolar a esfera dos meros dissabores cotidianos. Quando as circunstâncias excedem o simples descumprimento contratual, violando direitos da personalidade do consumidor, resta configurado o ilícito. No caso, o fato ocorreu minutos antes do início da aula, com conhecimento dos demais clientes, o que aumentou o constrangimento da autora. 8. Na reparação por dano moral, a prestação pecuniária possui as finalidades de servir como meio decompensação pelos constrangimentos/aborrecimentos experimentados pela parte requerente, de punir a parte requerida e de prevenir quanto a fatos semelhantes que possam ocorrer futuramente. 9. Não há um critério matemático para estabelecer o montante pecuniário devido à reparação. Oarbitramento do quantum compensatório a título de danos morais sofridos deve obedecer a critérios de razoabilidade, observando a condição econômica daquele que deve indenizar e considerar as circunstâncias envolvidas na situação fática em exame, de modo que a parte ofendida seja satisfatoriamente compensada sem que isso implique enriquecimento sem causa. 10. Atenta às diretrizes acima elencadas, aliadas ao grau da ofensa moral sofrida e sua repercussão,entendo o montante de R$ 5.000,00 (mil reais) como suficiente para, com razoabilidade e proporcionalidade, compensar os danos sofridos, sem, contudo, implicar enriquecimento sem causa. 11. No mais, tendo em vista que a academia deu causa a rescisão contratual, devem ser restituídos àautora os valores decorrentes do serviço que não foi usufruído a partir da ocorrência do fato. 12. Recurso CONHECIDO e NÃO PROVIDO. Sentença mantida. Custas recolhidas. Condenado o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação. 13. A súmula de julgamento servirá de acórdão, na forma do artigo 46 da Lei 9.099/95.(TJDFT - RECURSO INOMINADO CÍVEL 0707108-84.2021.8.07.0017, Relatora: Giselle Rocha Raposa,data do julgamento: 30/09/2022).