Ferra e Turin disputam comando do MPE

por CLÊNIA GORETTTH
terça-feira, 26 de outubro de 2010, 15h26
Marcelo Ferra de Carvalho, 38 anos, ingressou no Ministério Público Estadual em 1995. Formou-se em Direito pela UFMT, em 1993, com mestrado em Direito Obrigacional Público e Privado pela Universidade do Estado de São Paulo (Unesp). Atualmente é procurador-geral de Justiça e tenta a reeleição para mais dois anos. No MPE-MT já exerceu os cargos de secretário-executivo do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), coordenador da área criminal do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça (Caop) e presidente da Associação Mato-grossense do MP por dois mandatos. Atuou nas comarcas de Cuiabá, Pedra Preta, Itiquira, Poxoréo, Cáceres e Rondonópolis.
Roberto Aparecido Turin, 45 anos, ingressou no Ministério Público Estadual em 1993. Formou-se em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em 1992 e possui especializações em Direito Penal e Direito Público. Atualmente, exerce a função de promotor de Justiça auxiliar da Corregedoria-Geral do Ministério Público. No MPE, já exerceu os cargos de coordenador do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), coordenador das promotorias de Justiça de Defesa da Probidade Administrativa e do Patrimônio Público. Além de Cuiabá, atuou nas comarcas de Araputanga, Quatro Marcos, Nova Xavantina, Água Boa, Cáceres e Várzea Grande.
Por que o senhor decidiu disputar a reeleição ao cargo de procurador- geral de Justiça?
Ferra - Decidimos disputar a recondução ao cargo de procurador-geral devido à exiguidade do mandato frente às propostas assumidas na primeira eleição, sendo necessário um maior espaço de tempo para concretizar alguns avanços. No tocante à estruturação das promotorias, pretendemos em um segundo mandato a realização de concurso para servidores, a construção de nova sede das promotorias de Justiça em algumas cidades, a reforma e ampliação da sede das promotorias de Justiça em outras e a ampliação do prédio das procuradorias de Justiça. É importante frisar que quando buscamos a estruturação dos órgãos de execução e a ampliação do quadro institucional, estamos visando à prestação de um serviço de melhor qualidade à sociedade.
Turin - Resolvi disputar o cargo de procurador-geral de Justiça porque percebo o nosso Ministério Público em um momento singular e paradoxal, posto que apesar de vivermos um bom momento no aspecto físico e estrutural, vivemos também um tempo de desmotivação institucional. Pouco se discute internamente acerca dos interesses institucionais, dos caminhos para o Ministério Público no futuro,
da qualidade, eficiência e eficácia de nosso trabalho. Vejo a necessidade de motivação. Sinto que a interação do MP com a sociedade anda meio apática, desanimada. É preciso um procurador vocacionado, apaixonado pelas causas ministeriais e que fomente as discussões e faça um planejamento institucional que integre todo o MP e o reaproxime da sociedade.
Quais são as suas principais propostas?
Ferra - Defendemos um MP coeso, atuante e eficiente. Implementaremos fóruns de discussões regionalizados e submeteremos ao Colégio de Procuradores a criação de uma promotoria regional ambiental voltada à defesa da Floresta Amazônica, que servirá de projeto piloto para esta iniciativa. Trabalharemos pelo êxito do programa institucional de combate às drogas, sendo que colocaremos um promotor de Justiça no Gaeco com dedicação exclusiva para o tema, com a incumbência de dar apoio às demais promotorias de Justiçada área em todo o Estado. Instalaremos a Ouvidoria, visando a ampliar o canal de comunicação com a sociedade.
Turin - Revitalizar e readequar nosso planejamento estratégico e plano de trabalho anual, visando um planejamento enxuto, pontual e factível. Reestruturação administrativa e funcional. Realização de concurso e/ou licitações para serviços técnicos de apoio especializado (biólogos, contadores, peritos, assistentes sociais, pedagogos, etc.), tanto para capital como para núcleos regionais no interior do Estado. Implementar o orçamento participativo no MP. É necessário que o promotor de Justiça conheça o custo e a parcela destinada à manutenção e aos projetos de sua área de atuação. Retomada e revitalização das campanhas institucionais visando reaproximar o MPE da sociedade.
Como o senhor avalia atuação do MP no Estado?
Ferra - Avaliamos que a atuação do MP em nosso Estado é bastante positiva. Temos uma instituição formada por quadros valiosos, comprometidos e bem intencionados. Entretanto, a enorme gama de atribuições não possibilita uma atuação sem definição de prioridades e metas. É importante ressaltar que, quando iniciamos a gestão, deparamo-nos com uma realidade institucional diversa e única em termos de Ministério Público no Brasil, a existência das procuradorias especializadas, as quais absorveram grande parte das atribuições outrora confiadas única e exclusivamente à figura do procurador-geral. Em nossa concepção, tal iniciativa é extremamente válida.
Turin - Nós temos um quadro muito bom de promotores e promotoras de Justiça atuantes, dedicados, o MPE está presente em todos os rincões do Estado, mesmo nas localidades mais distantes. Falta liderança institucional, falta o procurador mostrar garra e vontade junto ao público interno e externo definindo objetivos e metas factíveis de trabalho, valorizando o trabalho dos promotores de Justiça e prestando contas à sociedade.
A população mato-grossense tem consciência do leque de atribuições do Ministério Público?
Ferra - A consciência da população sobre o papel do MP tem melhorado consideravelmente, devido, principalmente, à grande visibilidade adquirida pela instituição nos últimos anos. Entretanto, temos obrigação de estabelecer diretrizes que aproximem a instituição da sociedade. Nosso canal de comunicação com a sociedade deve ser aberto e direto, possibilitando a qualquer um do povo o conhecimento da atuação ministerial.
Turin - Sim, mas ultimamente sinto o MP, principalmente na figura de seu principal representante, o procurador, muito afastado da relação direta com a sociedade, temos atualmente uma administração superior voltada somente para aspectos internos. O MP precisa abrir-se criticamente, tanto para fora como para dentro, e reaproximar-se da sociedade, pois este vínculo é a nossa força e a essência do nosso papel de defensores dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A instituição está preparada para atender as demandas que chegam às promotorias?
Ferra - Quando comparamos a estrutura da instituição com aquela existente no passado, ficamos felizes. Mas, quando comparamos com as demandas da sociedade, verificamos que ainda temos que evoluir. Logicamente, além da estrutura, precisamos constantemente investir em capacitação dos membros e servidores. Atualmente, podemos dizer que estamos preparados para atender boa parcela das
demandas recebidas.
Turin - Sim, temos uma boa estrutura, que evidentemente pode e deve ser melhorada. Mas o que realmente falta é estudo, levantamento de dados, planejamento de metas para garantir eficiência e efetividade no atendimento destas demandas.
Como procurador-geral de Justiça, como o senhor definiria o perfil ideal para um promotor de Justiça?
Ferra - A pergunta é complexa, sendo difícil estabelecer uma padronização. Há grandes promotores e procuradores de Justiça com perfis diversos e modos de atuação distintos, que produzem resultados positivos. Mas, certamente, para ser um bom promotor de Justiça ou procurador de Justiça tem que ter compromisso institucional, buscando sempre uma atuação em prol da sociedade.
Turin - Queremos um promotor de Justiça com atitude, consciente da importância e da responsabilidade de seu cargo. Um promotor de Justiça que ande pelos bairros e ruas de sua cidade e dos municípios que integram a sua comarca, conhecendo a realidade, que vá às escolas, hospitais, cadeias, prefeituras e Câmaras Municipais, levando o MPE a interagir com a sociedade e a ser parceiro no crescimento da cidadania como um todo.
Existem alguns projetos que sugerem limitações para atuação do Ministério Público. Qual avaliação que o senhor faz desse cenário em nível nacional?
Ferra - O MP é uma instituição que incomoda, pois confronta interesses de pessoas e grupos que se julgavam inatingíveis, sendo a reação contrária previsível e esperada. Portanto, devemos estar sempre atentos e vigilantes contra qualquer medida que vise a limitar nossa atuação institucional, pois, caso venha acontecer, a sociedade será a grande prejudicada. Eventuais abusos esporádicos, atribuídos a uma minoria dentro da instituição, que podem e devem ser punidos, não podem servir de pretexto para retirar da instituição atribuições e prerrogativas.
Turin - É preocupante. Embora eu entenda que as lutas por poder e espaço são inerentes à democracia e vão sempre existir, preocupo-me com a falta de visão de muitos integrantes e dirigentes do Ministério Público que se voltam apenas para políticas internas e se esquecem que a fonte do nosso poder e do fortalecimento de nossas garantias salariais e institucionais está na sociedade, está lá fora e não dentro do Ministério Público. Conseguiremos reverter essas tentativas de retaliação e diminuição de nossos poderes e prerrogativas com muito mais facilidade e legitimidade se a coletividade, a sociedade civil organizada e as instituições democráticas forem nossas parceiras, e elas só o serão se houver uma boa interação institucional.