Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

LANÇAMENTO

Obra interdisciplinar debate dignidade e direitos na execução penal

por ANA LUÍZA ANACHE

segunda-feira, 28 de julho de 2025, 18h15

Lançado na noite da última sexta-feira (25), o livro “Execução Penal: Uma Visão Integrada da Justiça Criminal”, publicado pela Editora Casa, propõe uma nova abordagem sobre o sistema penal e penitenciário brasileiro. A obra reúne artigos de 15 autores, entre membros do Ministério Público, juristas, pesquisadores e operadores do Direito, que se dedicam à análise crítica da execução penal, oferecendo reflexões e alternativas para uma justiça mais humanizada e eficiente.

 

O promotor de Justiça Douglas Lingiardi Strachicini, um dos autores e organizadores da publicação, conta que ela trata de um tema extremamente atual para a sociedade e nasce de debates que surgem academicamente dentro da sala de aula, não apenas sobre a lei legislada e positivada. Ele assina o capítulo “Encarceramento Feminino no Brasil: Análise e Desafios sobre a Necessidade de uma Perspectiva Interseccional e da Criminologia Feminista”.

 

“Não pensem que todos os autores concordam entre si, muito pelo contrário. A gente amadurece ideias, reflete, e, a partir dessas reflexões, constrói uma obra que busca inovar, trazer novas perspectivas para quem tiver acesso à leitura. E, claro, tentar, academicamente, transformar muitas das posições que estão consolidadas, mas que nem sempre estão corretas”, afirmou.

 

O membro do MPMT antecipou alguns pontos polêmicos abordados. “Quando um tribunal declara que o estado de coisas de um sistema é inconstitucional, está reconhecendo a gravidade extrema das falhas e das violações de direitos humanos fundamentais que ocorrem nesse sistema. E é exatamente essa a realidade da execução penal no Brasil. Seja nas cadeias públicas, nas penitenciárias, nas poucas colônias agrícolas ou nos muitos espaços precários que existem. Em alguns estados, há até contêineres sendo usados como prisões, o que é absolutamente inaceitável. Tudo isso é abordado nesta obra”, revelou.

 

Por fim, o promotor de Justiça defendeu a garantia dos direitos humanos. “Acho que o ponto mais interessante e bonito deste livro é justamente o que os 15 autores trouxeram, discutiram e aprofundaram: como efetivar, concretizar, tirar do papel os direitos e garantias fundamentais que estão previstos na Constituição. Está tudo lá, escrito de forma bonita, em vários artigos, e também na Lei de Execução Penal. Mas será que isso chega, de fato, à pessoa que está cumprindo pena? A pessoa presa hoje tem, sim, o direito de ter suas garantias fundamentais preservadas. A dignidade humana não faz distinção entre quem está preso e quem está em liberdade”, defendeu.

 

A oficial de gabinete do MPMT Heckyelly Mendes Pereira, que também é autora e organizadora do livro, contribui com o capítulo “Análise do Sistema Prisional em Mato Grosso em Relação à Garantia da Dignidade da Pessoa Humana para Mulheres Transexuais e Travestis”. Ela conta que cada autor abordou um ponto específico.

 

“Eu, junto com a professora Vládia, abordamos a situação dos reeducandos LGBTQIAP+ e a importância de garantir que o cumprimento da pena ocorra com dignidade. Será que essa população tem sua dignidade humana respeitada da mesma forma que os homens cis em situação de privação de liberdade? Será que, quando se trata de pessoas LGBTQIAP+, os direitos humanos são ainda mais violados? Essa é a reflexão que trouxemos: a necessidade de olhar para essas diferenças e garantir igualdade de tratamento dentro do sistema prisional”, apontou.

 

Heckyelly defendeu que todos somos seres humanos e que aqueles que estão privados de liberdade não são menos dignos ou menos humanos do que qualquer um de nós. “A pena precisa ser cumprida, mas com dignidade. É fundamental garantir um mínimo existencial: alimentação saudável, água potável de qualidade e a proteção contra qualquer forma de violência, seja física ou psicológica. Isso é o básico. São questões humanitárias. Precisamos de uma visão mais humana para que o sistema prisional deixe de ser visto como um depósito de pessoas e passe a cumprir, de fato, o que está previsto em lei: reintegrar o indivíduo à sociedade. Que ele possa sair dali com uma nova perspectiva de vida. É por isso que todos nós estamos aqui, lutando por essa transformação. E vamos continuar”, acrescentou.

 

A professora Vládia Maria de Moura Soares postulou uma mudança do Estado. “Essa obra é fruto de uma reflexão bem aprofundada de 15 autores, entre eles alunos de mestrado e de graduação. Fizemos uma pesquisa rigorosa, com base no Estado Democrático de Direito e na Lei de Execução Penal. Analisamos a execução da pena, que muitas vezes é relegada. A sociedade, em geral, não se lembra das prisões e, quando se lembra, é para colocar mais gente lá. Eu costumo dizer, há muito tempo, que o Estado prende mal. Ele deveria se propor a fazer um trabalho melhor, garantindo os direitos das pessoas privadas de liberdade”, enalteceu.

 

O juiz da Execução Penal em Cuiabá, Geraldo Fernando Fidelis Neto, destacou o caráter inovador da obra ao apresentar, com profundidade, a realidade do cumprimento da pena no Brasil. “Estamos discutindo tudo isso justamente em um momento em que o país, com coragem, coloca em pauta o estado de coisas inconstitucional por meio do Plano Pena Justa. Isso é extremamente relevante e exige um debate aberto, franco. Estamos às vésperas de ver nosso governador e o presidente do Tribunal de Justiça assinarem a proposta do Plano Pena Justa de Mato Grosso”, manifestou.

 

O magistrado disse que a obra é viva e mostra que a pena deve ser cumprida, mas com respeito, dignidade e em conformidade com a Lei de Execução Penal, sempre com foco na reintegração social. “O que buscamos é uma sociedade mais harmônica, com direitos respeitados, onde as pessoas que passaram pelo sistema prisional não reincidam no crime e não retornem à penitenciária. Para isso, é fundamental envolver a sociedade nesse processo. É importante que todos leiam essa obra. A execução penal não pode ser reduzida a códigos, ela envolve uma diversidade de realidades que, de forma modesta, buscamos apresentar aqui”, garantiu.

 

A servidora do Tribunal de Justiça de Mato Grosso Patrícia Cristina dos S. Bachega revelou que a obra propõe, de fato, que as pessoas privadas de liberdade, os egressos e seus familiares tenham seus direitos respeitados, para que possam retornar à sociedade de forma digna, integrada e acolhida por seus pares.

 

“Essa é a proposta que permeia cada artigo da coletânea. Graças à abordagem interdisciplinar, a discussão vai além do campo jurídico, o que torna a leitura mais leve e acessível não apenas à comunidade acadêmica, mas também à população em geral, gestores públicos, colegas de profissão, mães, filhos e todos que se interessam pela pauta da execução penal no Brasil. Trata-se de um tema que nos diz respeito diretamente, pois estamos falando de cidadãos que não estão fora da sociedade e que, em breve, retornarão ao convívio social”, sustentou.

 

Os autores do livro são Amanda Jesuíta Kozievitch, Caio Cesar C. Cavalcante, Douglas Lingiardi Strachicini, Fernando Henrique T. Lampier, Felipe Athayde Lins de Melo, Geraldo Batista da Silva Júnior, Geraldo Fernando Fidelis Neto, Heckyelly Mendes Pereira, João Filho de Almeida Portela, Marcos Faleiros da Silva, Michelli Egues Dias Monteiro, Murilo Almeida Bento Pereira, Nayanne Stephanie G. Amaral, Patrícia Cristina dos S. Bachega e Vládia Maria de Moura Soares. Além dos integrantes do MPMT, são organizadoras da coletânea Patrícia Bachega e Vládia Soares.
 

Acesse o canal do MPMT no WhatsApp!

Galeria de imagens
Compartilhe nas redes sociais
facebook twitter
topo