Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

DECISÕES DO TRIBUNAL DO JÚRI

Aplicabilidade imediata e possibilidades de recursos são debatidas

por CLÊNIA GORETH

segunda-feira, 04 de setembro de 2023, 19h00



A decisão do Tribunal do Júri, órgão do Sistema de Justiça Criminal, composto por um juiz presidente e por jurados, que são pessoas leigas que atuam no julgamento de casos de crimes dolosos contra a vida, a exemplo dos homicídios e feminicídios, deve ou não ter aplicabilidade imediata? Terminado o julgamento, se condenado o réu deve iniciar de imediato o cumprimento da pena? A questão será enfrentada pelo STF, em sede de Repercussão Geral no Tema 1068. Outro ponto abordado foi a respeito da racionalidade recursal, que é objeto de discussão, no Tema 1087, para o qual também foi atribuída a repercussão geral pela Suprema Corte.

Nesta segunda-feira (04), durante o evento “Colóquios Ministeriais”, promotores e promotoras de Justiça de Mato Grosso discutiram a temática. O assunto relacionado à prisão imediata no Júri (Tema 1068) foi abordado pela presidente da Confraria do Júri, promotora de Justiça Marcelle Rodrigues da Costa e Faria. “É justo, é constitucional, é sistemático que para uma decisão soberana ser aplicada ter que aguardar decisões que não são soberanas?”, indagou a promotora de Justiça em sua palestra.

Marcelle Rodrigues argumentou que o artigo 1º da Constituição Federal estabelece a soberania como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, estando presente no voto e também no júri popular. “O júri é o exercício da soberania do povo, com decisão política e sigilosa. É a manifestação do povo diante de um injusto”, enfatizou.

A promotora de Justiça defende a aplicação imediata da condenação do Tribunal de Júri. Ela ressaltou que a duração razoável do processo é um direito da vítima e de seus familiares, que precisam fazer parte do processo. Além da análise do ponto de vista constitucional, a promotora de Justiça trouxe para a discussão Tratados Internacionais de Direitos Humanos que abordam a temática e coíbem o abuso recursal e o formalismo.

O promotor de Justiça  Fabison Miranda Cardoso, que atuou no painel como debatedor, destacou que a evolução do ser humano e do sistema jurídico nacional e internacional trouxe uma nova visão para os estados soberanos, principalmente em relação aos crimes perpetrados em decorrência da violação do direito à vida. “Devemos superar a visão monocular de efetivação das garantias. O Tribunal do Júri visa não só uma garantia ao acusado, mas uma finalidade precípua que é de proteção a essa vida, já que o constituinte originário entregou ao titular do poder o julgamento dos seus pares”.

Tema 1087 e Unidade Institucional – O coordenador do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (CEAF) – Escola Institucional do Ministério Público de Mato Grosso, promotor de Justiça Antonio Sergio Cordeiro Piedade, reforçou a importância da unidade institucional em relação a temas controvertidos.

“O Ministério Público deve ter unidade em sua atuação, como um fio condutor no enfrentamento de temas relevantes. O promotor de Justiça possui independência funcional, mas existem alguns entendimentos que precisam ser uniformes, precisamos trabalhar de forma articulada e coesa para que prevaleça a tese em favor da sociedade”, afirmou o coordenador.

Durante o evento, o promotor de Justiça abordou o tema tratado na Repercussão Geral 1087, que aborda a racionalidade recursal do Tribunal do Júri. A discussão é se deve ou não prevalecer o entendimento de que é possível interpor recurso para a realização de um novo júri quando a decisão dos jurados for totalmente contrária às provas dos autos.

O promotor de Justiça Antonio Sergio chamou a atenção para os riscos de se impedir a interposição de recurso pelo Ministério Público, pois existem julgamentos mais complexos, relacionados a grupos de extermínios, milícias, organizações criminosas, minorias, racismo estrutural e machismo estrutural, que os réus podem ser absolvidos injustamente pelos jurados, com fundamento em quesitos genéricos do júri e, via de consequência, inviabilizar nova análise da decisão proferida por um outro conselho de sentença.

Segundo ele, “a reforma da Lei 11.689/2008 não deu poderes ilimitados e peremptórios ao Tribunal do Júri, ou seja, toda decisão deve estar sujeita a controle”. Destacou ainda que o Brasil possui atualmente 11 condenações na Corte Interamericana em razão da impunidade e de violação aos direitos das vítimas e que inviabilizar o manejo recurso ante decisões absolutórias manifestamente contrária a prova dos autos, sujeitará o Estado brasileiro a novas condenações perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Impunidade - O promotor de Justiça César Danilo Ribeiro Novais, debatedor do tema, chamou atenção para a necessidade de discussão sobre a impunidade estrutural existente no país. “O óbvio tem sido ignorado, que é a inviolabilidade do direito à vida. No Brasil nada se fala sobre a impunidade estrutural. Em razão de uma necro-hermenêutica, a lei tem sido interpretada de maneira a fomentar a contagem veroz de cadáveres”, observou.

O coordenador dos Centros de Apoio Operacional, promotor de Justiça Caio Márcio Loureiro, enalteceu a importância da discussão, lembrando que o compartilhamento de conhecimentos contribuiu para o aperfeiçoamento da atuação institucional. “É um momento fundamental de aperfeiçoamento para as nossas atuações e evidentemente destinada a que haja uma melhor prestação de justiça no contexto dos direitos fundamentais, dentre eles, o principal, que é a tutela da vida”, observou.

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