Construí no terreno da minha Avó e ela faleceu. E agora? Como fica a situação da minha casa?
por Julio Carvalho
sexta-feira, 04 de outubro de 2024, 12h55
Como regra geral do Código Civil, quem constrói no terreno alheio perde para o dono do terreno a edificação levantada.
DE INÍCIO é preciso pontuar que a casa levantada em terreno de terceiros (inclusive parentes) via de regra não pertencerá a quem edificou, mas sim ao dono do terreno. Essa é a regra estampada no Código Civil que admite exceções, como já falamos. A regra - que não é nova e já estava no Código Civil de 1916 em seu art. 547 - desde 2002 com a edição do "novo" Código Civil consta do art. 1.255 que reza:
"Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização".
Excepcionaliza tal regra a chamada "acessão inversa", situação tipificada no par. único do referido art. 1.255 que não constava da codificação anterior, como esclarece o douto professor e Desembargador do TJSP, Dr. FRANCISCO EDUARDO LOUREIRO ( Código Civil Comentado. 2021):
"A principal novidade do preceito se encontra no parágrafo único do art. 1.255, que inverte um paradigma milenar, de o solo ser o PRINCIPAL e a construção/plantação o ACESSÓRIO. Atende a regra terreno à cláusula geral da função social da propriedade, conferindo ao construtor/plantador de boa-fé, que deu destinação econômica e social ao prédio, sobre ele consolidar a propriedade, indenizando o dono do solo, que permaneceu inerte, não utilizando o que era seu. O direito assegurado ao construtor/plantador está subordinado a dois requisitos cumulativos: a boa-fé e o valor consideravelmente superior da construção/plantação, em relação ao solo".
Reza, por sua vez, a regra do aludido par. único do art. 1.255:
"Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo".
A questão da construção em terreno alheio (principalmente de parentes) é uma constante nos vários problemas que tratamos, envolvendo questões imobiliárias. Muitas vezes decorrentes de uniões (casamentos ou uniões estáveis) onde o novo casal constrói no terreno dos pais de um deles, ou mesmo quando simplesmente um ascendente (pai, avô etc) autoriza que seu descendente (filho, neto etc) construa num "pedaço" de terra que lhe pertence. A boa intenção que a princípio circunda a situação na verdade pode estar mascarando sem mesmo que as partes tenham ciência disso, um grande problema no futuro, seja com o desenlace daquele casal construtor, seja com o falecimento do titular do terreno sobre o qual a suposta casa tenha sido levantada. Na hipótese em que um neto, por exemplo, edifique no terreno do seu avô, inclusive passando a habitar na referida casa poderá ser considerado proprietário do "seu imóvel" caso sobrevenha o falecimento do titular daquele terreno?
De acordo com as regras citadas, não sendo o caso de acessão inversa, o construtor deverá perder o imóvel em favor do titular do terreno, sendo importante pontuar que com o falecimento do titular do terreno, a herança (assim considerados bens e direitos, na forma da Lei) comporá o ESPÓLIO que deverá ser partilhado entre os herdeiros do falecido, depois de abatidas suas dívidas, na forma do art. 1.997 do Código Civil. Significa dizer que a casa edificada - que sempre foi do proprietário do terreno - com a morte desse passa a pertencer/constituir o Espólio que deverá ser partilhado entre os herdeiros. Eventual indenização, se cabível na forma do art. 1.255 do CCB, deverá ser requerida em face do Espólio.
Fonte: Jornal Jurid