Testemunho de morador de comunidade não invalida versão policial, diz TJ-SP
segunda-feira, 14 de abril de 2025, 13h27
O depoimento de morador de comunidade onde ocorre o tráfico de drogas, sem o reforço de provas em vídeo, não pode desacreditar testemunhos de policiais, já que essas pessoas são obrigadas a compactuar com o tráfico sob pena de represálias.
Esse foi o entendimento ratificado pelo juízo da 12ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo para manter a condenação de quatro homens por tráfico de drogas.
A decisão foi provocada por recursos do Ministério Público — para majorar a pena dos acusados — e da defesa, que pedia a nulidade do processo em razão de prova colhida em busca ilegal, quebra de cadeia de custódia e com base no depoimento de testemunhas.
Conforme os autos, os policiais foram até o endereço onde ocorreu as prisões para apurar denúncia anônima de que o local iria receber uma grande quantidade de droga destinada a abastecer pontos de tráfico de drogas.
Os policiais fizeram uma campana e avistaram um dos acusados saindo de uma casa e retornando com uma sacola cujo conteúdo se assemelhava muito a tijolos de maconha.
Os policiais se dirigiram a viela onde estava localizado o imóvel e foram atendidos pelo suspeito que ao ser questionado sobre as drogas apontou o local onde elas estavam sendo preparadas.
No local foram detidos mais três acusados. Foram encontrados 30 quilos de drogas: 25 quilos de maconha, parte em tijolos, parte em porções menores; 1,2 mil porções de K9; 3 quilos de crack; 1,5 quilo de cocaína em pó.
Versão das testemunhas
Entre as testemunhas de defesa estão vizinhos, moradores e a cônjuge de um dos acusados. O empregador de um dos réus chegou a mostrar o registro em carteira de trabalho dele e afirmou que ele trabalhou no dia dos acontecimentos e só foi dispensado para que pudesse visitar a família, já que o restaurante em que ele trabalha fica em Sorocaba, no interior do estado.
Uma das testemunhas é um vizinho da residência em que foi feita a apreensão da droga. Ele afirmou que viu o momento em que os policiais pularam o portão e invadiram área privativa com três habitações em comum. Ele também afirmou que teve a casa invadida e revirada pelos policiais.
Relator desacredita testemunhas
Ao analisar o caso, o relator, desembargador Heitor Donizete de Oliveira, defendeu que houve fundada suspeita na abordagem dos acusados, uma vez que os policiais foram até o local a partir de informações de denúncia anônima.
Segundo a versão dos agentes de segurança, ao chegar no imóvel, um dos réus permitiu a entrada dos policiais no local onde foram encontradas diversas substâncias ilegais.
“A atuação dos agentes policiais foi pautada em critérios de razoabilidade e proporcionalidade, pois, em tais circunstâncias, não se esperava outro comportamento dos policiais senão proceder a averiguação da denúncia anônima que não era solta mas específica para um endereço onde encontraram o acusado Julimar e ingressaram no imóvel com a autorização deste e realizaram a abordagem dos indivíduos que, como visto, foi lícita e confirmada pelas demais provas dos autos”, registrou.
Quanto ao depoimento das testemunhas de defesa, o relator decidiu manter o entendimento da juíza de piso. “Verificando as inúmeras ocorrências que os policiais civis realizam, mostra-se compreensível que, passados mais de três meses da data dos fatos, não prestem depoimento de maneira idêntica ao depoimento anterior ou se recordem de todos os detalhes da abordagem. Ademais, pequenas contradições ou divergências nos depoimentos das testemunhas, que não afetam a apuração da verdade, devem ser considerados como fruto da observação de cada uma, e, ao contrário dos absolutamente idênticos, não geram suspeitas ou dúvidas”, sustentou ao manter a condenação.
Perguntas não respondidas
Por meio de nota enviada à ConJur, os defensores dos acusados reiteram uma série de questionamentos.
Eles questionam o fato de policiais lotados no Butantã cruzarem a cidade de São Paulo até Ermelino Matarazzo para apurar uma denúncia anônima em uma diligência policial sem qualquer registro.
Também questionam o registro parcial da operação em um vídeo que não foi periciado e não mostra a entrada dos policiais na residência.
Por fim, questionam como o testemunho de um policial investigado por enriquecimento ilícito pelo Ministério Público foi validado. Conforme a investigação do MP, o agente realizou transações imobiliárias 20 vezes superiores ao valor de seus rendimentos anuais. Além disso, ele seria sócio de outro policial, também suspeito de enriquecimento ilícito, em diversas empresas.
Fonte: Conjur