Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Artigo - "Cibersegurança no Domínio Espacial"

por Paulo Pagliusi, Ph.D., CISM, C|CISO

quarta-feira, 10 de julho de 2024, 15h18

 

 

1.      Introdução

 

Olá, meus Tripulantes Cibernéticos. A segurança cibernética no domínio espacial tornou-se uma preocupação crescente à medida que a dependência de sistemas espaciais da humanidade aumenta. Satélites são fundamentais para diversas funções críticas, incluindo comunicação global, navegação por GPS, previsão do tempo e observação da Terra.

 

Com o advento do NewSpace e a crescente privatização do espaço, a segurança cibernética desses sistemas se tornou uma prioridade. Este artigo explora os desafios, medidas e iniciativas relacionados à segurança cibernética no domínio espacial, fundamentados em referências bibliográficas relevantes.

 

 

2.  Principais Desafios

 

Seguem os principais desafios para se manter a segurança cibernética no domínio espacial:

 

a.  Vulnerabilidades dos Satélites

 

Os satélites são alvos atrativos para ciberataques devido às suas funções críticas e à dificuldade de acessá-los fisicamente para reparos ou atualizações. Ataques podem resultar em desativação, desvio de órbita, manipulação de dados ou espionagem. Um exemplo notável é o ataque ao satélite Galaxy 15 em 2010, que resultou na perda temporária de controle [1].

 

b.  Comunicação Segura

 

Proteger a comunicação entre satélites e estações terrestres é essencial para evitar interceptação e interferência. Satélites transmitem dados sensíveis que, se interceptados, podem comprometer a segurança nacional e comercial. A interceptação de sinais de satélite foi demonstrada pelo ataque ao satélite de comunicação Intelsat em 1999, onde hackers conseguiram desviar os sinais de comunicação [2].

 

c.  Proteção de Dados

 

Garantir a integridade e confidencialidade dos dados transmitidos e armazenados nos satélites é crucial. Dados corrompidos ou alterados podem levar a decisões errôneas ou à falha de sistemas críticos. O aumento da quantidade de dados coletados por satélites de observação da Terra e a sua importância para a pesquisa e tomada de decisões políticas aumentam a necessidade de uma proteção robusta.

 

d.  Ataques de Negação de Serviço (DoS)

 

Ataques DoS visam sobrecarregar sistemas, tornando-os indisponíveis. Para satélites, isso pode significar a interrupção de serviços de comunicação ou navegação, com consequências potencialmente desastrosas. Em 2003, um ataque DoS afetou o sistema de GPS, causando interrupções temporárias [3].

 

e.  Segurança de Softwares e Firmwares

 

Softwares e firmwares de satélites precisam ser atualizados regularmente para corrigir vulnerabilidades. No entanto, atualizações maliciosas podem ser introduzidas, comprometendo a segurança e a funcionalidade dos satélites. A segurança de software se tornou um foco após a descoberta de malware que visava o software de controle de satélites [4].

 

 

3.  Medidas de Segurança

 

As principais medidas de segurança para se enfrentar os desafios da cibersegurança no espaço, descritos na seção anterior, são dispostas a seguir:

 

a.  Criptografia

 

O uso de criptografia avançada é essencial para proteger os dados transmitidos entre satélites e estações terrestres. A criptografia impede a interceptação e decodificação não autorizada de dados. Tecnologias como a criptografia quântica estão sendo exploradas para melhorar ainda mais a segurança [5].

 

b.  Autenticação e Controle de Acesso

 

Implementar métodos robustos de autenticação e controle de acesso é fundamental para garantir que apenas usuários autorizados possam acessar e controlar os sistemas espaciais. A autenticação multifator e o uso de tokens criptográficos são práticas recomendadas [6].

 

c.  Monitoramento e Resposta a Incidentes

 

Estabelecer sistemas de monitoramento contínuo e equipes de resposta rápida permite a detecção e mitigação eficaz de ataques cibernéticos. O desenvolvimento de Centros de Operações de Segurança (SOCs) dedicados a operações espaciais é uma tendência crescente [7].

 

d.  Redundância e Resiliência

 

Projetar sistemas espaciais com redundâncias e capacidade de recuperação rápida em caso de falhas ou ataques aumenta a resiliência. A utilização de satélites de reserva e a capacidade de reconfigurar redes espaciais contribuem para a continuidade do serviço [8].

 

e.  Colaboração Internacional

 

A cooperação entre países e organizações internacionais é crucial para compartilhar informações sobre ameaças e melhores práticas de segurança. Iniciativas como o Space Information Sharing and Analysis Center (ISAC) promovem essa colaboração [9].

 

 

4.  Exemplo de Iniciativas

 

Nesta seção, são apresentadas duas iniciativas favoráveis ao incremento da maturidade em cibersegurança no domínio espacial:

 

- Space Information Sharing and Analysis Center (ISAC): Esta iniciativa visa facilitar a troca de informações sobre ameaças e vulnerabilidades no setor espacial, promovendo uma abordagem colaborativa para a segurança cibernética [9].

 

- NIST IR 8270: Um relatório do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia dos EUA (NIST) que oferece diretrizes sobre segurança cibernética para sistemas espaciais, abordando práticas de mitigação de riscos e recomendações para proteger infraestruturas críticas [10].

 

 

5.      Futuro da Segurança Cibernética no Espaço

 

Com a expansão das operações comerciais no espaço e o aumento do número de satélites, a segurança cibernética continuará a ser um campo crítico. Investir em pesquisa e desenvolvimento, juntamente com a implementação de políticas robustas, será essencial para proteger os ativos espaciais contra ameaças cibernéticas. A evolução de tecnologias como a criptografia quântica e a inteligência artificial promete novas soluções para os desafios de segurança no domínio espacial.

 

O crescente número de atores privados e estatais operando no espaço adiciona camadas de complexidade e necessidade de uma abordagem mais robusta e colaborativa. A seguir, abordamos os principais aspectos que moldarão o futuro da segurança cibernética no espaço.

 

a.  Investimento em Pesquisa e Desenvolvimento

 

O aumento das ameaças cibernéticas e a sofisticação dos ataques exigem um investimento contínuo em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Instituições acadêmicas, empresas privadas e governos devem colaborar para desenvolver novas tecnologias e estratégias de defesa cibernética. Áreas prioritárias de P&D incluem:

 

- Tecnologias de Encriptação Avançada: O desenvolvimento de algoritmos de encriptação mais robustos e menos suscetíveis a ataques é essencial. A criptografia quântica, por exemplo, oferece potencial para comunicações invioláveis, baseando-se nos princípios da física quântica [5].

 

- Inteligência Artificial (IA) e Machine Learning (ML): A aplicação de IA e ML pode transformar a segurança cibernética espacial. Essas tecnologias permitem a detecção e resposta a ameaças em tempo real, identificando padrões anômalos e antecipando ataques antes que eles causem danos significativos [6].

 

- Blockchain: Utilizar a tecnologia blockchain para registrar e monitorar transações e comunicações espaciais pode aumentar a transparência e a segurança, impedindo modificações não autorizadas e garantindo a integridade dos dados [11].

 

b.  Políticas e Normas de Segurança

 

A implementação de políticas e normas de segurança cibernética robustas é crucial para proteger os ativos espaciais. Estas políticas devem ser desenvolvidas em colaboração entre nações, garantindo um consenso global e a aplicação uniforme de práticas de segurança. As principais áreas de foco incluem:

 

- Regulamentação Internacional: O estabelecimento de um quadro regulatório internacional que defina padrões mínimos de segurança cibernética para operações espaciais. A Organização das Nações Unidas (ONU), através do Comitê sobre a Utilização do Espaço Exterior para Fins Pacíficos (COPUOS), pode desempenhar um papel central neste processo [12]. A criação de órgãos internacionais dedicados à governança espacial, com foco em cibersegurança, pode facilitar a implementação de políticas coordenadas e a resolução de disputas relacionadas à segurança [8].

 

- Partilha de Informações: Incentivar a partilha de informações sobre ameaças cibernéticas entre nações e empresas é essencial para uma resposta coordenada, conforme enfatizado no item 3.e – Colaboração Internacional. Países e organizações internacionais devem firmar acordos bilaterais e multilaterais para a cooperação em segurança cibernética espacial, incluindo a partilha de inteligência, o desenvolvimento conjunto de tecnologias e a resposta coordenada a incidentes [10].

 

- Capacitação e Treinamento: Investir na capacitação de profissionais especializados em segurança cibernética espacial é vital. Programas de treinamento contínuo e a criação de centros de excelência podem garantir que as melhores práticas sejam adotadas e atualizadas conforme novas ameaças emergem [7].

 

c.  Evolução Tecnológica

 

A evolução tecnológica desempenhará um papel crucial na segurança cibernética espacial. Além das tecnologias mencionadas anteriormente, outras inovações emergentes incluem:

 

- Computação Quântica: Embora a criptografia quântica seja uma defesa promissora, a computação quântica também representa uma ameaça potencial, pois pode decifrar algoritmos de criptografia atuais. A preparação para um futuro com computação quântica implica no desenvolvimento de criptografia resistente a quânticos [13].

 

- Internet das Coisas Espacial (IoST): A conectividade de dispositivos no espaço, conhecida como IoST, requer protocolos de segurança específicos para garantir que cada dispositivo conectado seja protegido contra ataques cibernéticos. A implementação de padrões de segurança para IoST será prioridade crescente [14].

 

 

6.  Conclusões

 

A segurança cibernética no domínio espacial é uma preocupação crescente, que requer atenção contínua e colaboração internacional. Os desafios são significativos, mas com medidas robustas de segurança, é possível proteger os sistemas espaciais contra os ataques cibernéticos.

 

O futuro da segurança cibernética no espaço dependerá de uma combinação de inovação tecnológica, políticas robustas e colaboração internacional.

 

Investir em pesquisa e desenvolvimento, adotar novas tecnologias como a criptografia quântica e a inteligência artificial, e estabelecer políticas de segurança abrangentes são passos fundamentais para proteger os ativos espaciais contra ameaças cibernéticas.

 

A governança global e a cooperação contínua serão essenciais para enfrentar os desafios de segurança cibernética no domínio espacial.

 


 

Sobre Paulo Pagliusi

 

Paulo Pagliusi é Sócio Executivo da Pagliusi Inteligência em Cibersegurança. Ph.D. in Information Security pela Royal Holloway, University of London, Mestre em Ciência da Computação pela UNICAMP e pós-graduado em Análises de Sistemas pela PUC – Rio. Capitão-de-Mar-e-Guerra da reserva remunerada da Marinha, possui certificação internacional CISM (Certified Information Security Manager).  

 

Atualmente, exerce também os cargos de Diretor da ISACA Rio de Janeiro Chapter e de Pesquisador Sênior de TIC – Segurança Cibernética – Futuro da Defesa, no Laboratório de Simulações e Cenários (LSC) da Escola de Guerra Naval, tendo sido ao longo da carreira CIO da Apex-Brasil, Sócio de Technology Risk da KPMG e Diretor de Cyber Risk da Deloitte. É considerado um dos consultores mais renomados do País em gestão estratégica de TI e riscos tecnológicos, área em que atua há mais de 30 anos, ajudando clientes globais a avaliar, gerenciar e superar riscos emergentes em seus negócios.

 

Com experiência acadêmica como professor de graduação e pós-graduação, em instituições como IBMEC, PUC-Rio, Marinha do Brasil e Universidade Damásio, é articulista ativo e autor de livro sobre autenticação criptográfica na Internet. É um dos palestrantes mais requisitados atualmente, tendo se apresentado em mais de 200 eventos no Brasil e no exterior, e concedido mais de 100 entrevistas a mídias nacionais e internacionais.

 

FONTE: CRYPTO ID


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